Folha de S.Paulo

Livro sobre lenda dos Protocolos de Sião ganha versão em português

‘A Força da Mentira’ , de Hadassa Ben-Itto, é lançado hoje

- DIOGO BERCITO

Quando “Os Protocolos dos Sábios de Sião” foram publicados na Rússia em 1903, ninguém bradava “fake news!” para se referir a notícias falsas, como se faz hoje.

Mas eram falsas as notícias do livro sobre uma conspiraçã­o judaica para dominar o mundo, o que não impediu seu uso pelo nazismo para justificar o assassinat­o de 6 milhões de judeus.

Esse embuste é narrado no livro “A Força da Mentira”, lançado nesta quarta (22). A obra da israelense Hadassa Ben-Itto, de 1998, foi traduzida para 11 línguas, mas ainda era inédita em português.

Ben-Itto, 91, conta uma história de um século atrás, mas a ideia de uma falsidade que tem poder mesmo após desmentida é um tema bastante contemporâ­neo. A própria tese de uma conspiraçã­o judaica continua a fomentar o crescente antissemit­ismo.

“‘Fake news’ virou coisa da moda, mas os protocolos são ‘fake news’ há cem anos”, a autora disse à Folha. “Líderes políticos ainda utilizam a tese da trama judaica, como os nazistas fizeram.”

Nascida na Polônia, BenItto foi juíza por 31 anos em Israel, período em que se deparou inúmeras vezes com histórias sobre os “Protocolos dos Sábios de Sião”, livro que forja as minutas de uma inexistent­e reunião de judeus sobre a dominação mundial.

Aos poucos, ela passou a se incomodar com o fato de uma mentira sobre os judeus perdurar tanto. Decidiu antecipar a aposentado­ria e viajar pelo mundo para investigar a história dos protocolos.

Seis anos depois, publicou o best-seller (“sem linguagem acadêmica, para ser lido”).

“Lidei com muitos fatos enquanto era juíza, e sei que são importante­s”, disse. “Mas o que fazer quando os fatos são pervertido­s? A única solução é dizer a verdade.”

A publicação de “A Força da Mentira” foi financiada coletivame­nte a partir do projeto da jornalista brasileira Miriam Sanger, baseada em Israel. O livro integra a nova linha da Educ dedicada a temas judaicos. A PUC-SP tem há sete anos cátedra na área.

O presidente da cátedra e chefe da editora, José Luiz Goldfarb, foi dono da livraria Belas Artes, fechada em 2006, e se lembra de quando “pessoas sacanas entravam pedindo o livro” como forma de provocação. “Uma mentira como a dos protocolos teve um impacto enorme na história do século 20”, disse.

A obra da juíza Ben-Itto, nesse sentido, trata da persistênc­ia dessas falsidades. Os protocolos, afinal, ainda estão à venda —a descrição na loja da Amazon não explicita que a história é falsa e diz que “o leitor poderá elaborar a sua própria conclusão”.

“Por mais que uma mentira seja desmentida, ela sobrevive”, diz Goldfarb. Há então o debate: “Será que a liberdade de expressão se sobrepõe a um discurso mais efetivo do que as armas?” AUTORA Hadassa Ben-Itto EDITORA Educ QUANTO R$ 81 (480 págs.)

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