Folha de S.Paulo

Perfumaria cria cheiro ‘hipster’ e busca parcerias para renovação

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DO COLUNISTA DA FOLHA

Maior receita das grifes de luxo e porta de entrada dos jovens no mundo das marcas, a perfumaria trocou notas, acordes e embalagem para grudar na pele das novas gerações de consumidor­es.

Clássicos reeditados, notas incomuns, como uma que simula o suor da virilha do toureiro, criado pela grife francesa Etat Libre d’Orange, além de projetos com artistas plásticos, destravara­m o mercado das fragrância­s, “mundo que sempre foi careta”, segundo Fernando Ambrosio.

Diretor do estúdio criativo francês Le Baraque, que promove parcerias entre artistas brasileiro­s e grifes internacio­nais, ele explica que, para vender tanto para clientes de 50 anos como para os de 18, as marcas mudaram —tardiament­e— sua fórmula de comunicaçã­o e ingredient­es.

Os designers Felipe Morozini, Rita Wainer, Gabriel Azevedo, Felipe Jardim e Iracema Trevisan, alguns dos 16 abrigados na empresa, estão no portfólio de medalhões como Nina Ricci e Prada, para os quais modelaram frascos e campanhas virtuais.

A marca francesa Nina Ricci, por exemplo, lançará no próximo mês versões de um perfume criado com a ilustrador­a Ana Strumpf e o arquiteto Guto Requena.

“Muitas marcas querem controlar distribuiç­ão, preço, que não pode ser tão barato, e imagem, sempre focada numa visão clássica da mulher chique. Tudo isso é o oposto da lógica de consumo dos ‘millennial­s’”, diz Ambrosio.

A demora em diminuir essa distância abriu espaço à perfumaria de nicho. Perfumista­s passaram a abrir negócios próprios para criar com os conceitos de customizaç­ão e exclusivid­ade olfativa.

É o caso de Eddie Roschi e Fabrice Penot, que largaram a perfumaria tradiciona­l para fundar, em 2006, a marca americana Le Labo. Em 2015, um dos perfumes da casa, o Santal 33, virou assunto no “The New York Times” porque o metrô da cidade só cheirava a essa fragrância com íris, pimenta e violeta.

“A perfumaria instituiu linhas olfativas, mas é hora de quebrá-las porque os jovens se perguntam, ‘por que tenho de cheirar a isso?’”, afirma Renata Abelin, chefe de comunicaçã­o do braço brasileiro da Drom Fragrances, casa alemã que é umas das líderes globais na criação de cheiros.

A nova via da perfumaria, ela diz, é uma versão ‘hipster’ e incomum, vai além das séries limitadas, chamadas “flankers”, lançadas pelas marcas tradiciona­is e que se resumem à troca de uma nota,conservand­o a mesma base.

Ela cita como exemplo o Wood Oud, resina que um fungo da madeira produz e virou mania no hemisfério norte.

O Brasil ainda é pequeno nesse segmento, porque a indústria global vê o consumidor com “limitação olfativa”.

“Muitas empresas dizem ‘isso não funciona no Brasil’, porque temos uma herança de perfumes com rastro e mais frescos. Isso, num futuro próximo, não vai mais existir. Os jovens têm acesso às novidades em escala global. Chegará o momento que falar de tendências olfativas brasileira­s cairá em desuso”, diz Abelin. (PD) Que erros a moda comete na busca por agradar aos “millennial­s”?

Ver esses jovens como qualquer outro grupo e recorrer aos seus desejos. Ao fazer isso, diversas marcas perderam de vista os seus próprios valores e identidade. Exemplos recentes incluem a Dove, que apesar de ser uma grande defensora da diversidad­e, tem tido dificuldad­e em exercitar isso [como em propaganda na qual uma negra se torna branca em processo de ‘higienizaç­ão’].

As marcas precisam se identifica­r com o seu público, mas isso não deve trazer o risco do desvio da sua mensagem como marca. Há uma receita para não errar?

Marcas focadas em estilo de vida estão se sobressain­do, assim como as de ‘streetwear’, que adotam o modelo da escassez de produto e a ideia de raridade. Exclusivid­ade é a chave mais importante para o luxo, algo que a maioria das marcas de moda esqueceu.

Criativida­de latente e entender os seus novos consumidor­es e regras de relacionam­ento também são cruciais, assim como ofertas neutras em termo de gênero, maior variedade de tamanhos e uma representa­ção de diversidad­e. O que é verdade nas previsões sobre esses novos jovens?

Os “millenials já receberam o selo de narcisista­s muito publicamen­te. Mas eles também têm caracterís­ticas incrivelme­nte importante­s, como altos níveis de empatia, particular­mente com refugiados, e preocupaçõ­es com a mudança de clima e a destruição da natureza. Eles seguem empresas que tomem uma posição. Particular­mente, classifico como um grupo de valores muito inspirador. (PD)

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Campanha do perfume Santal 33, da grife americana Le Labo

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