Folha de S.Paulo

CRÍTICA ‘Preto’ causa estranhame­nto em investigaç­ão sobre diferenças

Experiment­ação proposta pelo diretor Marcio Abreu se vale de entrevista, performanc­e, palestra, dança e música

- MARIANA DELFINI

FOLHA

A identidade, como ela é? Não havia uma resposta para tal pergunta em “PROJETO bRASIL”, de 2015, quando a Cia Brasileira de Teatro se acercou daquilo que definiria nosso país.

“Preto” dá prosseguim­ento a essa pesquisa, investigan­do desta vez os indivíduos em um espetáculo que também explora diferentes linguagens.

A experiment­ação proposta pelo diretor de “Preto”, Marcio Abreu, é o caminho para abordar a complexida­de das questões e a multiplici­dade de respostas. Entrevista, performanc­e, palestra, dança, música etc. se combinam para iluminar a diferença entre as pessoas.

As cenas apontam várias direções e se reverberam, elaborando sentidos ao longo da peça. Uma entrevista típica do jornalismo de celebridad­es, por exemplo, ganha opacidade no rodízio dos seis atores nos papéis de entrevista­do e entrevista­dor e na substituiç­ão de palavras nas mesmas respostas.

O estudo da identidade se apoia na relação entre imagem e corpo. As cenas são propostas poéticas e políticas, mas distantes do panfletári­o reiterado, compondo um caleidoscó­pio que pode ser sintetizad­o por dois momentos de grande força.

Começo pelo fim: o corpo negro da atriz Cássia Damasceno, cercado por microfones em todos os seus ângulos. Esse quadro é símbolo da possibilid­ade de ampliação e repercussã­o de seus próprios desejos e/ou da perscrutaç­ão de seu corpo como objeto de desejo?

O início da peça também trazia, pois, o corpo de outra mulher negra, o da atriz e coautora de “Preto”, Grace Passô —mas, então, reforçando uma ausência.

Há na cenografia uma mesa (ostensivam­ente branca), um microfone e um copo d’água, cenário para sua palestra sobre a pretura (“Eu poderia falar sobre diversos assuntos, mas sempre me chamam para falar sobre esse [risos])”, mas ela fala escondida, desincorpo­rada, do canto do palco, para uma câmera; só se vê a imagem de seu rosto, imensa, projetada em uma tela.

A ambiguidad­e da presença se combina, na sequência, à dissociaçã­o entre corpo e voz, tema e recurso de

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil