Chez Cabral
SÃO PAULO - Precisamos decidir se vamos pensar as penas de prisão com a cabeça ou com o fígado.
Para a ala hepática, o encarceramento é essencialmente um castigo, inscrito numa perspectiva retributivista. Nessa concepção, o ideal mesmo seria executar os assassinos e castrar os estupradores e pedófilos, mas, como somos civilizados, nos contentamos em apenas trancafiá-los por longos períodos, torcendo para que sofram bastante em sua estadia.
Nesse contexto, a tentativa do deputado presidiário de contrabandear um provolone para a Papuda se afigura como uma burla ao próprio sistema de Justiça. Idem para os itens alimentares de luxo encontrados na cadeia em que estão o ex-governador do Rio Sérgio Cabral e aliados. Solitária é pouco para essa gente.
Já para os que preferem uma abordagem puramente racional do problema, categoria na qual me incluo, a própria ideia de restringir a liberdade é meio suspeita. Já deveríamos ter encontrado alternativas mais efe- tivas e menos onerosas. De todo modo, admitindo que o encarceramento faça sentido, ele teria a função de prevenir a repetição do crime, ao retirar, ainda que momentaneamente, seu autor de circulação e ao dissuadir terceiros de imitá-lo.
Sob essa ótica, o que o apenado come é irrelevante. A sanção prevista, afinal, é a restrição de liberdade, não a restrição calórica. Sendo ainda mais racional, faria todo o sentido permitir que prisioneiros de posses encomendassem suas refeições em restaurantes de sua preferência, poupando o contribuinte da despesa de alimentá-lo.
Sou cético, porém, em relação às chances de a visão mais racional vir a ser a predominante. O problema é que a natureza humana tem um elemento de sadismo, e as pessoas jamais considerariam justo um sistema em que o criminoso não sofre, mesmo que esse sofrimento seja não apenas inútil como também custoso. Nós pagamos pelo prazer de punir. helio@uol.com.br