Folha de S.Paulo

O delator e os delatados

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BRASÍLIA - Depois de se enrolar com o próprio gravador, Joesley Batista resolveu parar de falar. O empresário passou quatro horas em silêncio diante da CPI da JBS. Enquanto ele segurava a língua, os parlamenta­res o usaram como escada para aparecer na TV Senado.

A sessão promoveu o reencontro do delator com os delatados que o bajulavam. Ao menos 15 integrante­s da CPI receberam dinheiro do frigorífic­o na última campanha. Diante das câmeras, eles preferiram omitir a ajuda para atacar o ex-aliado.

“Acho que o senhor não é tão bandido quanto confessa ser”, disparou o relator Carlos Marun (PMDB-MS), destinatár­io de R$ 103 mil da JBS em 2014. “O senhor, que era um mafioso de terceira categoria, resolveu achar que era o Al Capone”, prosseguiu.

O deputado domina a temática como poucos. Ele despontou do anonimato como escudeiro de Eduardo Cunha, a quem foi visitar na cadeia. Depois virou defensor de Michel Temer, alvo de duas denúncias criminais.

“De tanto que os senhores armaram, caíram na própria armação”, repreendeu João Rodrigues (PSD-SC). Ele declarou ter recebido módicos R$ 7.500 da JBS na última eleição.

Joesley também enfrentou a artilharia de parlamenta­res bancados por seus concorrent­es. “Temos a sensação de que sua família é uma quadrilha, e a sua empresa, uma organizaçã­o criminosa”, atacou Heuler Cruvinel (PSD-GO), que levou R$ 100 mil do frigorífic­o BRF.

O deputado Paulo Pimenta (PTRS), que recebeu R$ 66,4 mil da JBS, tentou aliviar o clima com uma piada. “O senhor Joesley conseguiu fazer o Roberto Carlos comer carne”, gracejou. Em seguida, ele voltou a esbravejar contra a Lava Jato.

Num raro momento de trégua, João Gualberto (PSDB-BA) parou de bater no delator e se lembrou dos delatados. “Todo mundo sabe que são corruptos os vários que receberam”, disse. Antes de ser fuzilado pelos colegas, ele se corrigiu: “Não digo todos, não quero ofender todos...”

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