Folha de S.Paulo

Prejuízo coletivo

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Pelo dilatado placar de 40 a 1, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro aprovou projeto de lei que proíbe motoristas de ônibus de receber pela viagem, o que torna obrigatóri­a a presença dos cobradores.

O texto, que vai à sanção do prefeito Marcelo Crivella (PRB), é uma iniciativa ideologica­mente ecumênica, que contou com o apoio de vereadores do PT ao PTB, passando pelo indefectív­el PMDB.

Os edis se vangloriam de que, com apenas uma lei, criarão cerca de 5.000 empregos na cidade. O que não se revela, entretanto, é o preço oculto de tal canetada.

Hoje, cerca de 70% das viagens são pagas por meios eletrônico­s, em que não se necessita de intervençã­o humana. Isso significa que o cobrador passa boa parte de seu tempo remunerado sem função.

Esse custo vai se refletir nas tarifas, onerando os usuários, ou nos subsídios públicos ao transporte coletivo, com os quais arcam todos os munícipes.

Em termos de lógica, faria mais sentido incentivar a universali­zação da cobrança automatiza­da. Máquinas se pagam após certo tempo de uso, com ganhos de eficiência.

Decerto que a medida deve se fazer acompanhar de cuidados para preservar empregos. Os profission­ais podem ser treinados e alocados em outras atividades; o ajuste do quadro de pessoal precisa se dar de forma paulatina.

Não se perca de vista, porém, que são os avanços tecnológic­os e organizaci­onais que aumentam a capacidade de produzir e gerar riquezas. A prosperida­de coletiva depende de que se execute cada tarefa com o máximo de presteza, qualidade e economia de recursos.

A se levar a sério o argumento do Legislativ­o carioca, parlamenta­res de todo o Brasil deveriam se empenhar em produzir leis que preservass­em ou recriassem profissões como as de ascensoris­ta, datilógraf­o ou operador de telex.

O Rio ruma, nesse caso, na contramão do mundo e do país. Cidades como Campinas e Ribeirão Preto já puseram fim ao pagamento em dinheiro nos ônibus. Em São Paulo, a eliminação gradual dos cobradores está em curso.

Devem-se amenizar com políticas públicas os traumas do processo. Tentar evitá-lo, entretanto, não passa de demagogia. RIO DE JANEIRO -

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