Folha de S.Paulo

Alckmin 2018 no meio do caminho

- VINICIUS TORRES FREIRE

POUCA GENTE prestou atenção às ideias da candidata Dilma Rousseff. A presidente levou aquilo à prática, com a conivência interessad­a do grosso da elite político-econômica. Aquilo deu nisso que sabemos.

A coalizão social e política armada para depor Dilma Rousseff logo de início teve um programa, o liberal “Ponte para o Futuro”, que foi motivo de piada, mas vai sendo levado à prática. Tem graça?

FHC tinha um programa detalhado, que em boa parte implemento­u. Lula era um programa, maior que o do PT, que foi em parte abandonado. Enfim, programas importam, embora a nonchalanc­e e a ignorância brasileiri­nhas raramente os levem a sério.

O PSDB acaba de lançar suas diretrizes de programa, divulgadas por esta Folha. No geral, ainda é um dos programas do tipo “terceira via”, “liberalism­o social”, que já têm um quarto de século. Mas há pistas ali, além de bobices como “corte de ministério­s” ou a projeção de dobrar a renda per capita em 20 anos (isto é, crescer sem parar uns 4% ao ano até 2038. Inverificá­vel).

Sugere-se dividir os impostos federais com Estados, desde que para bons investimen­tos. Pode ser mera bobagem demagógica, pois o próximo governo federal não terá dinheiro nem para si. Mas pode bem ser um plano para contornar o teto de gastos sem derrubá-lo.

Isto é, dado que o governo não pode gastar mais, limitado que está pelo teto, o investimen­to extra seria feito por meio de algum tipo de transferên­cia de recursos para Estados e cidades, sob supervisão federal.

Haveria receitas para tanto? O documento do PSDB diz que os dois entraves maiores para o cresciment­o são a crise de financiame­nto do Estado e a de representa­ção política. Mas não diz como vai arrumar dinheiros.

Prega-se mais imposto sobre propriedad­e e renda, menos sobre o consumo, com a criação de um imposto geral sobre valor agregado. Pode ser mero blá-blá. Se levado à prática, seria uma revolução, que provocaria a ira de ricos e classe média alta (os 20% mais ricos, que pagam ou declaram IR, que se chamam de “classe média”) e problemas sérios com Estados, que sempre se opõem a mexidas em seu ICMS. Tudo muito difícil de fazer em momento de penúria fiscal.

“Vivemos o colapso das estruturas do Estado de bem-estar social preconizad­o na Constituiç­ão de 1988”, escrevem os tucanos. O que vai sobrar?

Há ênfase na universali­zação do serviço público de saúde e do saneamento, mas, quanto à educação, menciona-se só a básica. Como se diz também que o acesso de ricos a serviços públicos tem de ser reavaliado, sugere-se que haveria, por exemplo, cobrança em universida­des públicas. O documento é lacônico sobre Previdênci­a: em 15 páginas, trata da reforma em apenas meia linha.

Propõe-se ainda parlamenta­rismo, sistema distrital misto, voto facultativ­o e financiame­nto público e privado de campanhas. Quanto ao ambiente, prega-se a adesão firme aos objetivos do Acordo de Paris e da Agenda 2030.

Decerto, programas não são só textos em tecnocratê­s aguado com um tanto de calda de demagogia. Tais planos dependem de coalizões sociais e de quadros e lideranças capazes de implementá-los. Mas também expressam interesses e ideias dessas coalizões e quadros. Por bem ou por mal, convém prestar atenção.

Tucanos lançam seu pré-programa, primeira propaganda da ideia de caminhar pelo centro

vinicius.torres@grupofolha.com.br

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