Folha de S.Paulo

O passeio de Eike

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Eike Batista perdeu a peruca, mas não perdeu a pose. Em depoimento à CPI do BNDES, ele se apresentou como visionário, patriota e perseguido pela Lava Jato. Os senadores facilitara­m o passeio com perguntas dóceis e inofensiva­s.

Preso em janeiro sob acusação de pagar propina a políticos, o ex-bilionário foi recebido como um convidado VIP. Ficou tão à vontade que parou a conversa para exibir um filme promociona­l. O vídeo exaltava o Porto do Açu, um dos empreendim­entos que o império X deixou pela metade.

“Ele foi desenhado para ser eficiente ao extremo”, enalteceu Eike, no mesmo tom em que vendia seus projetos megalômano­s. “Eu sou um brasileiro, sempre fui um soldado do Brasil”, continuou.

Na maior parte do tempo, só dois senadores ouviram a autopropag­anda. O tucano Roberto Rocha, relator da CPI, mostrou despreparo ao perguntar se o empresário era parente do dono da JBS. Eike é filho de Eliezer Batista, ex-ministro e ex-presi- dente da Vale. Joesley é filho de Zé Mineiro, que começou como açougueiro no interior de Goiás.

O depoimento prosseguiu em clima de camaradage­m. O petista Jorge Viana pediu a “visão do empresário” sobre a crise do Rio. Eike recitou frases de efeito e disse que o Brasil precisa ser pensado “de uma maneira holística”. Depois sugeriu a criação de uma “Embraer dos mares”.

Ninguém citou o nome de Sérgio Cabral, acusado de receber US$ 16,5 milhões do ex-bilionário em troca de favores do governo. O habeas corpus de Gilmar Mendes, cuja mulher é sócia do advogado de Eike, também não entrou em questão.

No fim da sessão, o pessedista Lasier Martins ensaiou apertar o empresário. “Dois bi [bilhões] em meio de dólares para a campanha do PT é muito dinheiro!”, disse. Eike o corrigiu aos risos: “Não é dois bi não, é dois mi [milhões]. Pelo amor de Deus”. “Ah, bom”, respondeu o senador. Poucos minutos depois, Eike foi liberado para pegar seu avião.

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