Em sarau com Brian Jackson, artistas celebram poesia negra
Músico e ativista americano, parceiro de Gil Scott-Heron, lidera base instrumental para versos
Evento nesta quinta (30) e sexta (1º/12), no Sesc Pompeia, reúne músicos como Mano Brown e Juçara Marçal
“Uma das missões da minha vida é fazer com que a poesia negra chegue a mais e mais pessoas.” A frase é do músico americano Brian Jackson, 54, parceiro do poeta e também músico Gil Scott-Heron (1949-2011), autor de um dos hinos do ativismo civil dos anos 1970 nos EUA: “The Revolution Will Not Be Televised” (a revolução não será televisionada, em inglês).
Jackson e Scott-Heron consagraram o uso de um recurso conhecido como “spoken word” na música, quando versos são declamados ou falados sobre bases de jazz, funk e soul. No caso deles, versos majoritariamente políticos, ligados ao movimento negro.
“Que formas de protesto temos? Nossas vozes. E como envolver as pessoas na nossa mensagem?Pegandoosexemplos do que Wall Street e Madison Avenue [endereço nova-iorquino das agências de publicidade] fazem para vender seus produtos: usam música para chamar a atenção das pessoas”, explica Jackson.
“Sempre procurei criar músicas que atraíssem as pessoas para as palavras.”
Nesta quinta (30) e sexta (1º/12), no Sesc Pompeia, em São Paulo, Jackson encabeça o espetáculo “Black Poetry”, que celebra a poesia negra e o “spoken word” na voz de artistas como Juçara Marçal, Mano Brown e Black Alien.
Nas duas noites, Jackson vai empunhar flauta e teclado acompanhado por um time de brasileiros: Thiago França (saxofone), Mauricio Takara (bateria), Marcos Gerez (baixo), Rogério Martins (percussão) e Guilherme Granado (sintetizadores).
As palavras serão de autoria de brasileiros como Cartola (1908-80), de americanos como Langston Hughes (190267) James Baldwin (1924-87), da angolana Alda Lara (193062) e da moçambicana Noémia de Sousa (1926-2002).
As poetas africanas tiveram seus versos escolhidos pela cantora Juçara Marçal. “Queria dar voz a essas mulheres potentes e tão pouco conhecidas por aqui”, diz ela.
Para Marçal, a literatura produzida por negros sofre um processo de invisibilidade no Brasil. “Fiz faculdade de letras e lá nunca se falou na escritora negra Carolina de Jesus (1914-1977), que fui conhecer muito tempo depois de formada”, lembra.
O cantor Rodrigo Carneiro, 46, extrapola essa análise para outras expressões culturais. “Já tive de explicar que o rock era mais uma das muitas contribuições negras para a cultura”, conta.
Jackson diz que a poesia negra e o “spoken word” derivam da tradição oral dos griots, contadores de história do oeste da África que se valiam de música, canto e poesia para transmitir mitos e notícias.
“Quando passamos a investigar e valorizar nossas heranças, nos conectamos com a função do griot”, diz ele, para quem o “spoken word” é o grande precursor do hip-hop.