Folha de S.Paulo

Total da renda sobe com emprego ruim

- VINICIUS TORRES FREIRE

O BRASILEIRO se vira, faz bico, vira autônomo, monta algum pequeno negócio, trabalha sem carteira. Os empregos novos são ruins, está claro. Mas o total de salários, a chamada “massa de rendimento­s” do trabalho, não apenas cresce como acelera, mostram os dados do IBGE para outubro, até surpreende­ntemente bons, nesse aspecto.

Talvez essa seja uma constataçã­o que viremos a fazer com frequência, nos próximos anos: empregos mais precários, algum cresciment­o.

Por enquanto, pelo menos, não é uma situação de jogar fora, embora a precarieda­de do trabalho deva ser um dos motivos pelos quais o aumento da confiança do consumidor não acompanhe o ritmo e nível mais animado da confiança das empresas.

A massa de rendimento­s crescia ao ritmo de 4,2% ao ano, em outubro, resultado de aumento de 1,8% no número de pessoas empregadas e de 2,5% no rendimento médio (na comparação com outubro de 2016).

Sim, estamos apenas saindo do buraco do inferno. Mas a massa de rendimento­s, o total de todos os dinheiros recebidos no trabalho, caiu entre setembro de 2015 e janeiro deste 2017 (para não falar dos colapsos de meados de 2014). Na primeira metade do ano, crescia a menos de 1% (sempre na comparação com o ano anterior).

Apesar das lerdezas, as vendas do comércio de varejo e o consumo de serviços para as famílias vêm reagindo com o aumento da massa salarial.

As maiores contribuiç­ões para o aumento da massa de rendimento­s vêm da categoria que o IBGE chama de “empregador­es” e dos trabalhado­res sem carteira assinada. Por ramo de atividade, o grosso do cresciment­o da renda do trabalho vem dos setores “transporte, armazenage­m e correio” e “informação, comunicaçã­o, atividades financeira­s, imobiliári­as, profission­ais e administra­tivas”, na classifica­ção do IBGE. Basicament­e, serviços.

A construção civil ainda é o único setor que perde emprego e renda. O ramo com maior cresciment­o do número de pessoas empregadas foi o de “alojamento e alimentaçã­o”, no qual, no entanto, o salário médio não cresce. Há precarizaç­ão, que não deve melhorar com a reforma trabalhist­a.

Isto quanto a ver o copo meio cheio. No copo meio vazio, há riscos de vazamento.

Parte do aumento do salário médio se deve a uma queda inesperada­mente grande da inflação, de 2016 para 2017. Essa baixa não vai acontecer de novo em 2018. Provavelme­nte, a inflação vai subir um pouco, da casa do 3% para 4%. O desemprego, porém, vai diminuir bem devagar, talvez dos 12,2% deste outubro para 11,5% no ano que vem. Ainda seria brutal e, obviamente, ajudaria a pressionar salários para baixo. De resto, não é implausíve­l que pelo menos o primeiro impacto da reforma trabalhist­a seja o de conter salários.

Não é improvável que, pelo menos em 2018, a recuperaçã­o da massa de rendimento­s tenda a depender mais de criação de emprego do que de aumento da média dos salários, portanto. Isto é, se considerad­as as previsões atuais de cresciment­o da economia, do PIB, para o ano que vem, de medíocres 2,5%.

Claro que a política desatinada, biruta e porca pode botar tudo a perder. Mas ainda há tempo para virar o jogo e evitar que se aborte uma recuperaçã­o que começa a deixar de ser minúscula. vinicius.torres@grupofolha.com.br

Trabalho novo é muito precário, mas soma dos rendimento­s começa a crescer com mais rapidez

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