Folha de S.Paulo

Mudar a política

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Mais do que nunca, a população não se reconhece nos representa­ntes que elegeu. Frequentes atos de hostilidad­e a parlamenta­res são só o sinal exacerbado de um sentimento que na melhor das hipóteses se traduz na indiferenç­a pela política, e, na pior, no repúdio ao próprio sistema democrátic­o.

Face a tão evidente crise, preocupa o fato de que reformas efetivas —como a adoção do sistema distrital misto e do voto facultativ­o— nunca cheguem a prosperar.

Ao menos é positivo que venham aparecendo movimentos dedicados a controlar mais de perto a atuação dos parlamenta­res e dos membros do Executivo.

A mecanismos já conhecidos, caso do site do Diap (Departamen­to Intersindi­cal de Assessoria Parlamenta­r), somam-se iniciativa­s recentes, como a Tchau, Queridos.

Esta visa a apresentar a posição de cada congressis­ta com relação, por exemplo, a teses caras ao movimento anticorrup­ção; nada impede que, no mesmo site ou a partir de óticas diversas, outros temas e atitudes sejam expostos à análise do eleitor.

Cabe lembrar que tais projetos não se sustentam sem algum tipo de financiame­nto. Dentre os trabalhos da ONG Transparên­cia Brasil, o site Excelência­s, com diversos critérios de fiscalizaç­ão pública da atuação parlamenta­r, foi descontinu­ado por falta de patrocínio.

Muito sofisticad­o, o Atlas Político mapeia, por exemplo, o grau de apoio de cada deputado ou senador aos projetos do Executivo. Já na própria Câmara dos Deputados, o sistema eletrônico Dados Abertos ainda carece de melhor desenvolvi­mento técnico.

Mais recursos ainda serão necessário­s, provavelme­nte, para que a divulgação desses instrument­os transforme seu uso num hábito disseminad­o entre parcela significat­iva do eleitorado.

Na outra ponta do processo, noticia-se a criação de um fundo destinado a oferecer bolsas de financiame­nto para que candidatos sigam cursos de formação política.

Com apoio do apresentad­or Luciano Huck e doações do empresário Eduardo Mufarej, a ONG RenovaBR anuncia já ter recebido pedidos de inscrição de 4.000 interessad­os, dos quais 45% políticos.

A entidade frisa estar aberta a filiados de todos os partidos —constitui excelente indicador a adesão tanto de membros do PSOL quando do PMDB e do DEM.

Tudo ainda se mostra bastante incipiente, mas de todo modo sintomátic­o de um desejo de mudar; se o descontent­amento com a política atinge todos os campos do debate ideológico, é de esperar que também o apartidari­smo oriente as iniciativa­s para superá-lo.

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