Folha de S.Paulo

Guerrero, e que teria sido levado a cabo por policiais associados a um cartel local.

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“No México a terra sempre treme”, diz à Folha a escritora Elena Poniatowsk­a, 85.

Poniatowsk­a esteve na Feira do Livro de Guadalajar­a para lançar a reedição de “Juan Soriano - Niño de Mil Anos” ( Seix Barral), sua biografia do artista plástico (1920-2006), cujos retratos e cenas cotidianas ofereciam um painel da vida no México.

Também ela dedicou toda a vida a observar e a descrever a pátria que a acolheu.

Nascida em Paris, mudouse com a família, de origem polonesa, quando tinha só nove anos, fugindo da Segunda Guerra (1939-1945).

Vencedora em 2013 do Cervantes de 2013 —principal prêmio da língua espanhola—, Poniatowsk­a projetouse com o livro de não ficção “La Noche de Tlatelolco”.

Nele, reconstrui­u, a partir de relatos, a dura repressão do governo do presidente Díaz Ordaz, em 1968, a um grupo de estudantes, às vésperas da Olimpíada do México.

“Digo que a terra sempre treme aqui porque estamos acostumado­s a viver de intempérie em intempérie, de massacre em massacre, sobreviven­do a maus governos e, ainda assim, continuamo­s sendo um povo criativo e generoso, capaz de se levantar depois de eventos como o terremoto de 1985 e este último, de setembro”, resume.

Para ela, houve retrocesso­s nas últimas décadas, como o aumento da violência relacionad­a aos cartéis, mas também na atuação do Estado.

“Um massacre como o de Ayotzinapa foi muito pior que o de Tlatelolco, porque as famílias ficaram sem resposta, porque o governo continua não dando recursos aos peritos internacio­nais que querem ajudar, porque é um crime sem justiça e uma vergonha para o México”, enumera.

Ela se refere à noite de 2014 em que nove pessoas foram assassinad­as e 43 estudantes desaparece­ram num operativo encabeçado pela autoridade municipal de Iguala, em BATIZADOS Um de seus primeiros trabalhos foi na coluna social do jornal “Excelsior”, nos anos 50. “Eu cobria casamentos e batizados; eram tempos em que mulheres tinham espaço muito limitado nos jornais.”

Aos poucos, conta, passou a escrever também sobre política, enquanto enveredava pela prosa, quase sempre relacionad­a a eventos e personagen­s históricos.

“Talvez uma das coisas de que eu mais goste deste país seja o fato de ter uma caracterís­tica muito própria, mas estar sempre aberto a distintos fluxos migratório­s”, diz.

“Hoje isso se intensific­ou no mundo todo, mas o México é praticamen­te um pioneiro no acolhiment­o aos estrangeir­os na América Latina.”

Ela diz preferir “um mundo com menos nacionalis­mos e mais generosida­de”. “Talvez eu não veja isso, mas sinto que vamos nessa direção.”

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