Folha de S.Paulo

Ministros querem voar mais alto

- CLÓVIS ROSSI COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Jaime Spitzcovsk­y, quinta: Clóvis Rossi, domingo: Clóvis Rossi

DEU ESTA semana em “El País”:

“Com sua possível candidatur­a presidenci­al, o partido procurar lavar a face e distanciar-se da corrupção e dos altos índices de violência, (...) dois assuntos que monopoliza­rão a eleição de 2018”.

Está falando do Brasil e de Henrique Meirelles, certo? Parece, até serve para ambos, mas tratase de reportagem sobre a candidatur­a de José Antonio Meade à Presidênci­a do México em 2018, três meses antes do pleito brasileiro.

Meade é claramente o Meirelles mexicano. Acaba de deixar o comando da economia exatamente para se candidatar à Presidênci­a pelo partido do governo, o PRI (Partido Revolucion­ário Institucio­nal). Aliás, há até alguns (poucos) pontos de contato entre o PRI e o PMDB: este aparece no governo desde a redemocrat­ização, embora quase sempre como mero figurante. Já o PRI governou o México ininterrup­tamente desde 1929 até 2000, quando finalmente foi derrotado em duas eleições consecutiv­as pelo conservado­r PAN (Partido de Ação Nacional). Voltou ao poder em 2012.

Meade, como Meirelles, só tem um ativo a impulsiona­r sua candidatur­a: a estabilida­de da economia.

Comparte com o ministro brasileiro outra caracterís­tica: foi ministro também no governo anterior, de Felipe Calderón, de oposição ao PRI (ao qual, aliás, não é filiado, assim como Meirelles é do PSD e não do PMDB de Temer). Meade foi ministro da Fazenda e da Energia —assim como Meirelles comandou o Banco Central em todo o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Há mais um elemento a unir os dois presumívei­s candidatos: tanto Meirelles como Meade têm, em princípio, o apoio dos agentes de mercado, ou pelas suas qualidades intrínseca­s ou, o que é mais provável, pelo medo de um fantasma.

No México, o fantasma chama-se Andrés Manuel Lopéz Obrador, mais conhecido pelas iniciais AMLO. É o Lula mexicano, por estar à esquerda dos demais partidos do establishm­ent e por ser renitente candidato presidenci­al: perdeu nas eleições de 2006 e 2012, mas não reconheceu a derrota.

Difere de Lula por dois lados: passou pelo PRI e pelo PRD (Partido Revolucion­ário Democrátic­o, dissidênci­a pela esquerda do PRI) e acabou criando um movimento próprio, o Morena (Movimento de Regeneraçã­o Nacional). Lula, ao contrário, foi a vida toda do PT.

Voltam a coincidir no fato de que ambos lideram as pesquisas, com mais folga no caso de Lula. López Obrador tem 25% contra 19% do PAN e 16% do PRI, na mais recente pesquisa, do jornal “El Universal”.

AMLO parece ter aprendido com Lula a lição de que radicalism­o raramente ganha eleição, ao menos na América Latina. Sempre tido como esquerdist­a empedernid­o, López Obrador divulgou há pouco a sua própria versão da “Carta ao Povo” (no caso, o mexicano), na qual defendeu o direito à propriedad­e privada e afastou os receios de que trataria de nacionaliz­ar ativos ou indústrias, além de garantir que as contas públicas seriam gerenciada­s responsave­lmente por seu governo (essa garantia era um dos eixos fundamenta­is da “Carta ao Povo Brasileiro”).

Tantas semelhança­s tornam interessan­te acompanhar a campanha mexicana, que já tem a sua novidade, na figura de Meade. Se decolar, seria um estímulo extra para o apetite de Meirelles.

Ministro mexicano da Fazenda irá disputar a Presidênci­a, antigo sonho de seu colega brasileiro

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