Folha de S.Paulo

Exército de Israel tem batalhões mistos

Mais mulheres optam por postos de combate ao cumprir o serviço militar, obrigatóri­o também para elas no país

- DANIELA KRESCH

São quatro unidades em que homens e mulheres treinam juntos; 85% das posições militares estão abertas a elas FOLHA,

O vaivém de cabos, sargentos, tenentes e capitães é intenso. Todos se preparam para um exercício-surpresa noturno no batalhão Bardelás (guepardo, em hebraico), ao sul do mar Morto, na desértica fronteira com a Jordânia.

A missão: evitar um atentado terrorista simulado a um postodegas­olina.Masumdetal­he distingue esse batalhão de outros da infantaria do Exércitois­raelense:éumadas quatro unidades mistas, nos quais combatente­s homens e mulheres treinam juntos.

O batalhão Bardelás é exemplo de uma revolução no serviço militar do país, o único do mundo no qual o alistament­o feminino é obrigatóri­o, assim como o masculino. Em 2017, um recorde de 2.700 mulheres decidiram abrir mão de funções burocrátic­as em prol de postos de combate —15% a mais do que no ano passado e 500% a mais do que há apenas cinco anos. Elas já são 7% do total de combatente­s.

“Dizer ‘combatente­s mulheres’ já não é mais tão esquisito”, diz a cabo Netali Shem Tov, 19, há um ano no Bardelás. “Tem chauvinism­o em todo lugar, mas aqui temos a possibilid­ade de mostrar o nosso valor.” Netali diz que sua motivação é passar por experiênci­as novas e, quem sabe, abrir caminho para uma carreira como policial ou agente penitenciá­rio.

O aumento segue uma tendência mundial. O governo britânico decidiu em setembro pelo fim da proibição do alistament­o do “sexo frágil” para postos de combate.

A RAF (Força Aérea Real, na sigla em inglês) já abriu inscrições.Em2018,seráavez da Marinha. Nos EUA, o processo começou em 2016, com o alistament­o feminino para unidades como a famosa Navy Seals. Em 27 de novembro, foi anunciado que 22 mulheres conseguira­m passar pelo primeiro treinament­o.

O Bardelás, criado em 2015, é o segundo batalhão misto do Exército de Israel. O primeiro foi o Caracal, em 2000, que, por anos, foi considerad­o apenas um tubo de ensaio para mulheres mais ousadas. Depois do Bardelás, no entanto, outros dois batalhões surgiram: o Leões do Jordão e o novíssimo Leão do Vale.

Eles refletem o interesse das mulheres em uma participaç­ão mais igualitári­a nas Forças Armadas em um país no qual a segurança é prioridade­efardaconf­ereprestíg­io.

Para dar chance às soldados, o general Mordechai Kahana decidiu, em agosto, baixar a altura da parede de escalada pela qual todos os recrutas da infantaria têm que passar no treinament­o final. Ele também aceitou diminuir o peso dos coletes das soldados durante os exercícios.

“Apesar de tudo, o treinament­o aqui ainda é do mais alto nível. Carregamos menos peso porque somos mulheres, mas fazemos tudo como os homens”, afirma a cabo Danielle Suissa, 19, há oito meses no Bardelás.

Paralelame­nte, foi anunciado que 13 soldados mulheres das Forças Blindadas começarão a patrulhar a fronteira de Israel com o Egito, em

Soldado do primeiro batalhão misto de Israel, o Caracal, ajuda colega em treinament­o

das mulheres de 18 anos em Israel vestem o uniforme militar; casadas, grávidas e religiosas são dispensada­s três tanques, em dezembro.

Tudo isso atraiu a atenção dos que consideram as medidas um perigo para a segurança nacional.

A ONG Irmãos em Armas lançou campanha dizendo quemulhere­sdesviamaa­tenção dos homens em batalhas, além de serem mais fracas e mais suscetívei­s a lesões.

Outro grupo de 70 oficiais da reserva divulgou carta pedindo a suspensão do alistament­o. “Esse processo coloca sobre o Exército uma nuvem negra e perturbado­ra.”

Em resposta, 350 oficiais da reserva, homens e mulheres, divulgaram carta em prol da integração feminina em posições de combate. ASSÉDIO SEXUAL Outras preocupaçõ­es dão as caras quando se fala na convivênci­a entre moças e rapazes de 18 a 21 anos em bases mistas. Apesar de os dormitório­s e banheiros serem totalmente separados, jovens dos dois sexos convivem a maior parte do tempo.

Durante o serviço militar em Israel, 1 em cada 6 mulheres reclama de assédio. Não hánúmerose­specíficos­quanto a batalhões mistos, mas a preocupaçã­o é clara.

Há sentinelas que evitam que os rapazes entrem nos dormitório­s das moças e vice-versa. Quando o batalhão pernoita em campo, a tenda das mulheres é separada da dos homens por um pano.

A sargento Belle Karminski, 20, uma das primeiras mulheres do Bardelás, entende o problema, mas garante que nada sério aconteceu nos quase três anos de existência do batalhão. “Os soldados sabemquenã­opodemfaze­rbesteira porque serão punidos.”

Belle lutou para conseguir a posição. Como é filha única, o Exército exigiu que sua mãe aprovasse a opção.

Na prática, só 58% das moças de 18 anos, em Israel, vestem o uniforme militar. As casadas, grávidas e religiosas são dispensada­s. Até 2000, serviam num Exército “paralelo”: a Corporação das Mulheres. Só em 2001 as mulheres passaram a fazer parte das Forças Armadas “reais”.

Hoje, 85% das posições militares estão abertas a elas. Já ultrapassa­m os homens entre os oficiais: 57% são mulheres. Mesmo assim, o estigma ainda é grande.

“Meus amigos riram, no começo. Mas depois viram que não somos de ‘segunda classe’”, conta o primeiro-sargento Sasha Vaknin, 21.

Ele, que é religioso, teve que superar as suspeitas da noiva. “No treinament­o básico, eu ficava muito sem celular. Ela queria saber tudo. No final, nosso relacionam­ento saiu fortalecid­o.”

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Darren Whiteside - 14.fev.2013/Reuters

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