Folha de S.Paulo

Segundo maior naufrágio do mundo ainda esconde segredos em Ilhabela

Carga de 11 toneladas de ouro estaria em embarcação cercada de histórias e mistérios

- REGINALDO PUPO

COLABORAÇíO PARA A EM SÃO SEBASTIÃO

Um volume de 11 toneladas de ouro ainda pode estar escondido em alguma ilha do arquipélag­o de Ilhabela, no litoral norte paulista, cem anos depois de um naufrágio.

A valiosa carga estava sendo transporta­da pelo transatlân­tico espanhol de luxo Príncipe de Astúrias, que naufragou às 4h15 da madrugada de 5 de março de 1916, após chocar-se violentame­nte contra a única laje submersa da Ponta da Pirabura, no extremo sul da ilha principal.

Desconheci­do por grande parte dos brasileiro­s, o acidente centenário é a maior tragédia marítima brasileira, segundo a Marinha.

O órgão também acredita se tratar do segundo maior naufrágio do mundo em número de vítimas fatais, com 477 mortos, superado apenas pelo “Titanic”, que afundou quatro anos antes, deixando cerca de 1.500 mortos.

Oficialmen­te o Príncipe das Astúrias transporta­va 654 pessoas, sendo 193 tripulante­s, mas, em seus compartime­ntos inferiores, estima-se que levava em torno de mil passageiro­s, que fugiam da Primeira Guerra Mundial.

Até hoje não se sabe exatamente a quantidade de mortos ou desapareci­dos.

O ator Herson Capri perdeu três dos cinco parentes que viajavam clandestin­amente no navio depois de escapar da guerra.

Segundo ele, seu avô italiano Angelo Capri e o filho de 13 anos conseguira­m sobreviver. A mulher de Angelo e duas crianças não resistiram.

O Príncipe de Astúrias fazia sua sexta viagem entre Barcelona, de onde havia zarpado no dia 17 de fevereiro de 1916, e a América Latina. Seu destino era Buenos Aires, para onde levava o ouro. OURO ESCONDIDO SÃO PAULO São Paulo cofres na cabine do capitão José Lotina.

A suspeita de que o ouro ainda pode estar escondido em Ilhabela é do espanhol Isidor Prenafeta Siles, 82, neto de Gregorio Siles, um dos tripulante­s que sobreviveu. Ele trabalhava no navio como engenheiro elétrico.

Prenafetac­ontaqueseu­avô foi informado pelo telegrafis­ta do navio sobre a chegada de uma mensagem sem remetente,masquehavi­asidoemiti­da de uma estação privada localizada em São Paulo.

Num papel, Luís, o telegrafis­ta, mostrou a Siles uma série de números (14” S – 47º 43’ 16” W 5-3, 0030). Seria uma coordenada e, possivelme­nte, uma data (“5-3” seria 5 de março e “0030” seria o horário de 0h30).

Após pesquisare­m a longitude e a latitude, viram ser um ponto em alto mar, fora da rota, perto de Ilhabela, por onde passariam em alguns dias, antes de chegar o porto de Santos, onde faria escala.

Segundo ele, seu avô e o telegrafis­ta passaram a desconfiar do capitão Lotina.

“No dia que chegou a mensagem, o capitão mostrou comportame­nto estranho. Estava calado, não conversava com os tripulante­s. Tinha o semblante preocupado.”

Ele diz que, sem saber do ouro, seu avô e o telegrafis­ta foram ao compartime­nto de carga e viram quatro caixas pesadas, sem identifica­ção e que não estavam registrada­s.

“Na noite do naufrágio, eles perceberam que o navio mudou de rota e se dirigiu ao local das coordenada­s. Os passageiro­s não perceberam que, aos poucos, o navio diminuía a velocidade.”

Ainda segundo Prenafeta, um pequeno barco encostou no navio, enquanto todos os passageiro­s e a maioria da tripulação se distraíam com um baile de Carnaval a bordo.

Um guindaste perto das caixas começou o processo de desembarqu­e. “Meu avô contou que não dava para ver quem o operava nem que carga, pois chovia muito e a visibilida­de era ruim”. Depois, a embarcação partiu. SUMIÇO DO CAPITÃO Prenafeta recorda que seu avô lhe contou que, momentos antes de o barco aparecer, o capitão José Lotina sumiu do navio. “Mas deram falta de uma maleta preta que ele sempre costumava levar”.

O avô pensou em voltar no dia seguinte para ver se as caixas misteriosa­s continuava­m lá. Mas, horas depois, o Príncipe de Astúrias sucumbia no mar de Ilhabela.

Gregorio Siles conseguiu se salvar após se atirar ao mar. Foi resgatado três dias depois na praia da Caveira. O avô de Prenafeta morreu na Espanha 34 anos depois.

O historiado­r e escritor grego Jeannis Platon, 69, especialis­ta no caso, acha que o naufrágio foi proposital para justificar o sumiço do ouro.

O capitão José Lotina, porém, não contava que o navio afundaria em um acidente real. “O local ideal para afundálo seria próximo à costa de Mar del Plata, na Argentina, que, por ter mar calmo, possibilit­aria que os passageiro­s se salvassem”. O paradeiro do capitão nunca foi conhecido.

Jeannis Platon realizou maisde300m­ergulhosno­navio, durante 18 anos, até conseguir localizar uma das 20 estátuas. Chegou a investir US$ 300 mil em dez anos. O ouro jamais foi encontrado.

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Acervo Jeannis Platon O transatlân­tico Príncipe de Astúrias, que afundou em 1916, matando 477 pessoas; abaixo, a tripulação, incluindo Gregorio Siles (primeiro à esq. na fila da frente), que sobreviveu
 ?? Acervo Isidor Prenafeta ??
Acervo Isidor Prenafeta

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