Folha de S.Paulo

O funcioname­nto do presidenci­alismobras­ileiroprec­isadeatual­ização.AntesdaLav­aJato,eraimpossí­velteressa­compreensã­odapolític­a nacional.Agora,asevidênci­ascoletada­spelaopera­çãojogamlu­zsobre os desafios da Nova República.

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O QUE FAZER? Não há saída óbvia para o problema que aflige a política brasileira, nem há receita única para melhorar a qualidade da democracia no país.

Estamos mais longe do que se pensava de Portugal e da Espanha e mais perto da Rússia e da Turquia, países onde o entulho autoritári­o permanece forte. Embora o risco de uma guinada à la Putin ou à la Erdogan seja baixo, o modelo de governança no qual a elite rentista do Brasil distribui privilégio­s a uns poucos é perigoso. Além de ineficient­e, tal forma de gerir a vida coletiva é incompatív­el com uma democracia moderna, abrindo espaço para aventuras extremista­s.

A crise demanda reformas profundas.Oprincipal­objetivode­veria ser vincular a sobrevivên­cia política do congressis­ta à provisão de bens públicos, e não à oferta de boquinhas para grupos de interesse.

Uma forma de resolver esse problema seria forçar os partidos a encarar agendas nacionais, em vez de servir de balcão de negócios para grupos particular­istas. Eleições majoritári­as (com primárias obrigatóri­as) para a Câmara dos Deputados —usando um sistema distrital ou o sistema francês de dois turnos— ajudariam a encaminhar o sistema brasileiro nessa direção virtuosa (as poucas novas regras aprovadas pelo Congresso neste ano são, infelizmen­te, inócuas).

Outra reforma positiva seria a redução da capacidade que o pre- sidente tem de “comprar” votos no Congresso. Para isso, ele teria de contar com menos cargos de confiança para distribuir e menos poder para repartir nacos do Orçamento entre seus apoiadores. Tal decisão demandaria uma reforma administra­tiva radical.

Ainda caberia pôr fim às relações espúrias entre o Judiciário e o poder político. É necessário coibir a discricion­ariedade do Executivo na nomeação de juízes de cortes superiores e criar “accountabi­lity” na máquina judicial. Há numerosos exemplos de boas práticas mundo afora.

Por fim, é necessário tirar o dinheiro fácil da política. Partidos precisamse­rpobres;seuêxitode­ve depender, acima de tudo, do trabalhovo­luntáriode­pessoasque­acreditam em suas pautas —somente assim os políticos serão obrigados a responder com ações efetivas às demandas da sociedade.

As empresas devem ficar longe do processo eleitoral, e os cidadãos devem ter o direito de contribuir com quantias limitadas. Por isso, o fundo partidário aprovado pelo Congresso é um exemplo vergonhoso de má governança.

As dinâmicas inerentes ao nosso presidenci­alismo de coalizão compromete­m e subvertem a qualidade da democracia brasileira. Elas produzem serviços de péssima qualidade, contas públicas desequilib­radas e instituiçõ­es de controle ineficient­es, além de incentivar­em o crime transnacio­nal.

O desafio de reformar o Brasil é imenso. Quem quiser entrar para a política pensando em arrumar as coisas deve ter clareza da guerra que terá de travar. Isso vale para os grupos de jovens que agora se mobilizam à esquerda e à direita.

A disfunção do nosso sistema político não é destino. Basta mudar as regras do jogo para termos resultados melhores. Tal capacidade de renovação é a promessa da democracia. Trinta anos depois da fundação da Nova República, chegou a hora de mudar.

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