Folha de S.Paulo

A CASTANHA SUMIU

Mudanças no clima são causa mais provável de uma queda de 70% na safra de castanha-do-pará, que atingiu todo o território da Amazônia; para suprir a demanda, empresas ampliam leque de fornecedor­es e contato com extrativis­tas

- FERNANDA REIS

Comprar castanha-do-pará para as festas de fim de ano será tarefa mais difícil em 2017. “Não deu castanha. De 500 toneladas de uma safra razoável, não chegou a cinco neste ano. Muito, muito, muito fraco”, diz Marcelo Salazar, sobre a área em que trabalha. Ele é coordenado­r-adjunto do programa Xingu em Altamira, do ISA (Instituto Socioambie­ntal).

Não foi um sumiço pontual: segundo a Embrapa, a queda não tem precedente­s por ter atingido toda a área e produção —de uma safra para outra, a redução foi de 70%. “Foi uma queda muito brusca, todo o mundo sentiu, porque o mercado ficou procurando —e não tinha”, diz a pesquisado­ra Lúcia Wadt.

Variações na safra de castanha-do-pará são comuns. Anos de alta produtivid­ade são seguidos por anos de bai- xa. Mas não como neste 2017. E o problema: não se sabe, por ora, a causa dessa queda.

Cláudio Maretti, diretor do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservaçã­o da Biodiversi­dade), lista e descarta algumas hipóteses: teriam as castanheir­as sido superexplo­radas e parado de produzir frutos? “Isso se mede em décadas, não de um ano para o outro.”

Falta de recursos para a exploração? “Não é o caso, a castanha está dando um bom preço e é uma das atividades principais dos extrativis­tas.” O mais provável é que a causa seja a mudança climática.

Dúvida igual paira sobre o cumaru, planta usada em cosméticos e na cozinha, que também quase não deu, de acordo com Salazar.

Segundo a Firmenich, empresa de aromas e fragrância­s, a safra realmente foi menor, mas sem estudos de longa duração não dá para dizer se isso se deve ao ciclo produtivo da planta ou ao clima.

Alterações climáticas são particular­mente duras com a castanha, pois entre a geração e a maturação passa-se um ano. “É diferente de um caju ou de um limão, que têm ciclos de produção um pouco mais curtos e reagem de formas diferentes a mudanças mais sistêmicas”, diz Salazar.

Quando as flores que deram origem aos frutos dessa safra estavam se formando, no fim de 2015, a região enfrentou uma seca severa e prolongada —cujos efeitos foram sentidos agora. DESABASTEC­IMENTO Empresas que utilizam pequenas quantidade­s do insumo não sentiram a quebra de safra neste ano, pois tinham estoque, como a Lush —ela emprega óleo de castanha em alguns produtos de beleza.

Situação diferente da Beraca, que produz ingredient­es para cosméticos. Segundo Érica Pereira, da área de sustentabi­lidade da empresa, a produção já havia apre-

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Castanheir­a, que pode chegar a 50 metros de altura

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