Em áudio, Hawilla negocia propina para Marin, Del Nero e Teixeira
Conversas do empresário foram mostradas durante o julgamento do ex-presidente da CBF
Ex-presidente do Flamengo Kleber Leite também aparece nos áudios combinando valores de suborno
Jotinha e Klebinho. Nas conversas mais explícitas sobre negociação de pagamentos de propina reveladas até o momento no julgamento do escândalo de corrupção da Fifa, J.Hawilla, o dono da Traffic, e Kleber Leite, ex-presidente do Flamengo e dono da Klefer, discutem em tom carinhoso transferências ilegais a uma série de cartolas.
Os diálogos foram gravados por Hawilla, que assumiu culpa e colabora há quatro anos com as investigações das autoridades americanas no caso Fifa. Eles foram apresentados na Corte de Justiça do Brooklyn durante o julgamento de José Maria Marin, ex-presidente da CBF acusado de participar do esquema.
“Era R$ 500 mil pro Ricardo [Teixeira], R$ 500 mil pro Marco Polo [Del Nero] e R$ 500 mil pro [José Maria] Marin”, diz J. Hawilla, o Jotinha, a Leite, o Klebinho, lembrando um acordo que fizeram de pagar R$ 1,5 milhão relativos à compra de direitos comerciais e de transmissão da Copa do Brasil de 2013 a 2022.
Leite, em tom preocupado, discorda dos valores, dizen- do que eram R$ 2 milhões, alegando ter feito “uma equação para incluir mais gente” e manter seu “compromisso moral” de continuar fazendo as remessas para Ricardo Teixeira mesmo depois que o cartola havia renunciado à presidência da CBF, em 2012.
O contrato foi firmado em agosto daquele ano pela Traffic e pela Klefer com a CBF, ou seja, na época em que Teixeira ainda estava no comando da confederação do país.
Quando ele foi substituído por Marin e Del Nero assumiu as funções de Teixeira na Fifa e na Conmebol, a propina das duas empresas passou a ser compartilhada pelos três.
Uma série de e-mails entre J.Hawilla e Flavio Grecco, executivo da Traffic, mostram, de fato, que a nova equação a que se refere Leite aumentou para R$ 2 milhões o valor pago aos três cartolas, R$ 1 milhão para Teixeira e R$ 1 milhão para Marin e Del Nero –parte das transferências era feita pelo Delta, um banco sediado em Miami.
Na conversa gravada por J.Hawilla como parte de um acordo de delação premiada com a Justiça americana, Leite aparenta nervosismo e desconfiança. “Aqui não é Estados Unidos, aqui é um perigo filho da puta. Não dá para falar dessas coisas no telefone.”
E também alude às anotações apreendidas na sede da Klefer, no Rio, como registros dos pagamentos de propina. “O que é tá lá no meu cofre bonitinho. Eu tenho tudo no meu cofre com a minha letra, eu mesmo escrevi”, afirma.
José Maria Marin, que se declara inocente, também aparece pela primeira vez flagrado numa conversa sobre propina. No evento de lançamento da Copa América Centenário, há três anos, J.Hawilla pergunta se tudo já estava acertado com Kleber Leite.
Ele responde que sim e também diz que a “conversa está indo muito bem” com Hugo Jinkis e Mariano Jinkis, os argentinos donos da Full Play, que teriam pago propina a ele e Del Nero relacionada a direitos da Copa América. Marin diz não saber se havia recebido, mas que ele iria “conferir com Marco Polo”.
Usando um tanque de oxigênio e falando com dificuldade, J.Hawilla foi questionado na sequência por Charles Stillman, advogado de Marin.
O americano tentou desqualificar o testemunho do dono da Traffic ao enfatizar que suas conversas gravadas tinham como objetivo arrancar informações que pudessem incriminar os réus.
Também fez J.Hawilla admitir que havia mentido aos promotores durante as negociações que levaram ao acordo de delação premiada –o empresário havia dito que fez seu último pagamento ilícito em 2011, mas depois reconheceu ter pago US$ 10 milhões em propina três anos depois.
J.Hawilla ainda aguarda sua sentença nos Estados Unidos. Ele terá de pagar US$ 151 milhões a autoridades americanas, sendo que já entregou US$ 45 milhões. O empresário pode pegar uma pena de até 80 anos de prisão pelos crimes que confessou.