Folha de S.Paulo

Tartaruga por lebre

- LAURA CARVALHO COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank;

A REVISÃO dos números do PIB feita pelo IBGE na sexta-feira (1º) indicou que a recessão de 2015-2016 não foi a mais profunda da história. De acordo com os números recém-divulgados, a economia encolheu 8,2% na crise de 2015-2016, ante queda de 8,5% do PIB na de 1981-1983. Os dados anteriores apontavam contração de 8,6% na crise mais recente.

A diferença de três décimos é pequena, mas suficiente para interditar no noticiário e nas análises econômicas a expressão “a maior crise da nossa história”. O problema é que, mesmo que não tenha sido a mais profunda, a crise dos últimos anos parece estar sendo sucedida pela mais lenta das recuperaçõ­es.

Tomemos como parâmetro as três maiores crises medidas pelo Codace (Comitê de Datação de Ciclos Econômicos).

A primeira —essa sim a maior de nossa história— teve início no primeiro trimestre de 1981 e durou nove trimestres, com o vale (que costumamos chamar de fundo do poço) tendo sido atingido no primeiro trimestre de 1983. Dali em diante, a economia levou sete trimestres para retornar ao PIB pré-crise, que só é superado no fim de 1984.

A segunda entre nossas maiores recessões foi a que vigorou entre o terceiro trimestre de 1989 e o primeiro trimestre de 1992. A queda nesse caso foi mais longa, durou 11 trimestres, mas sua magnitude foi um pouco menor —7,7% no acumulado. Ainda assim, a velocidade de recuperaçã­o foi a mesma que na crise anterior: no fim de 1993, após sete trimestres, a economia atingiu seu nível pré-crise.

Segundo o Codace, a crise de 2015-2016 teve início no segundo trimestre de 2014 e durou 11 trimestres, ficando empatada com a recessão de 1989-1992 no posto de “mais longa da nossa história”. Passados três trimestres desde o fundo do poço, que foi atingido em dezembro de 2016, a economia ainda encontrase em um nível 6,2% menor do que o que vigorava em março de 2014.

Para que a recuperaçã­o fosse finalizada, como nas recessões de 1981-83 e 1989-92, em sete trimestres, a economia teria que crescer 6,6% em um ano. Nem otimistas contratado­s ousariam prever uma aceleração de tal nível, que ocorreu pela última vez quando o país viveu seu melhor ano da história recente, em 2010.

Se a economia brasileira crescer 0,9% em 2017 e 2% ao ano a partir de 2018, por exemplo, o PIB précrise só seria atingido em dezembro de 2021, somando nada menos do que 20 trimestres de recuperaçã­o.

E, mesmo se o cresciment­o a partir de 2018 fosse de 3%, como projetam aqueles que ignoram os efeitos contracion­istas que o teto de gastos e a contração cada vez maior dos investimen­tos públicos terão sobre a economia, o PIB précrise só seria superado em junho de 2020 —14 trimestres depois de o fundo do poço ter sido atingido.

Enquanto o governo tenta vender tartaruga por lebre, os dados do IBGE mostram que, na recuperaçã­o mais lenta da história, 75% dos empregos criados são informais — sem carteira assinada ou por conta própria— e que o restante foi gerado no setor público.

Com a população ciente de que seu padrão de vida não está melhorando, o candidato que se propuser a defender o “legado de Temer” nas eleições de 2018 já sai derrotado. LAURA CARVALHO,

Mesmo que não tenha sido a mais profunda, crise está sendo sucedida pela mais lenta das recuperaçõ­es

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