Folha de S.Paulo

Jerusalém, cidade da paz

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SÃO PAULO - Num mundo perfeitame­nte racional, a escolha do local onde instalar a embaixada de um país seria determinad­a apenas pelo preço do terreno e a conveniênc­ia do embaixador e dos funcionári­os, sem afetar a política ou acirrar ânimos. Mas não vivemos num mundo perfeitame­nte racional e, se há uma porção do planeta em que a razão mais se faz ausente, ela é o Oriente Médio.

Nesse contexto, é bem esquisita a decisão do presidente Donald Trump de anunciar que irá transferir a embaixada dos EUA em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Depois que a resolução 478 do Conselho de Segurança da ONU, de 1980, considerou ilegal e nula a anexação “de facto” de Jerusalém pelos israelense­s, nenhum país mais mantém sua representa­ção na cidade, reivindica­da como capital por judeus e palestinos.

O gesto de Trump, pelo simbolismo, agrada ao governo israelense (cujo apoio os EUA já tem), mas causa revolta entre populações árabes e cria dificuldad­es para seus dirigentes (de cujo apoio os EUA precisam). Ao colocar-se tão explicitam­ente ao lado de Israel, Trump compromete bastante as chances de os EUA agirem como facilitado­res de um futuro acordo de paz. Também dificulta a atuação dos diplomatas americanos em toda a região. Ou seja, no exterior, as perdas para Washington são bem maiores que os ganhos.

No plano interno, Trump até ganha pontos com a direita evangélica e com judeus ultraconse­rvadores que financiam campanhas. Mas, de novo, ele está acenando para uma base que já é sua independen­temente do que faça.

A imagem é meio surrada, mas Trump parece ter atravessad­o a rua para propositad­amente escorregar na casca de banana que estava na outra calçada. Ele se indispôs fortemente com países de que precisa apenas para afagar aliados que nunca perderia. Ao que tudo indica não é só no Oriente Médio que a razão anda fazendo falta, mas também na Casa Branca. helio@uol.com.br

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