Folha de S.Paulo

Refundação do país não tem volta, diz Barroso

- VINICIUS MOTA

O Ministério Público Federal realizou nesta quinta (7) uma cerimônia de devolução de R$ 653,9 milhões para a Petrobras. Segundo a Procurador­ia, esta é a maior quantia já recuperada em uma investigaç­ão criminal.

A devolução foi possível por meio de acordos de colaboraçã­o e leniência da Lava Jato, como os firmados com as empreiteir­as Odebrecht e Andrade Gutierrez.

A Procurador­ia utiliza a recuperaçã­o dos valores como um argumento a favor dos acordos, criticados por parte dos profission­ais do Direito e da sociedade civil.

Essa é a décima devolução de recursos desde maio de 2015, quando houve a primeira. Com o repasse, o total de recursos transferid­os desde o início da operação chega a cerca de R$ 1,475 bilhão.

De acordo com o MPF, esse valor representa apenas 13% dos R$ 10,8 bilhões previstos nos 163 acordos de colaboraçã­o e nos dez de leni- ência firmados.

Participar­am do evento o presidente da Petrobras, Pedro Parente, e o procurador Deltan Dallagnol, além de representa­ntes da Justiça, da Polícia Federal e da Receita.

“Não tenho dúvida de que os corruptos não representa­m a Petrobras”, afirma Dallagnol, chefe da força-tarefa. “É preciso que o Congresso e o Judiciário preservem o bom funcioname­nto desses institutos [acordos de colaboraçã­o premiada e de leniência]”, diz.

Parente afirmou que a Petrobras é “a principal vítima do que foi um gigantesco esquema de desvio de recursos públicos”. Questionad­o sobre sua indicação à estatal ter partido do PMDB, implicado no escândalo, Parente diz que o apoio dado por Michel Temer à Petrobras foi o maior entre os presidente­s.

“Estou absolutame­nte confortáve­l [no cargo]. A autonomia que Temer deu ao presidente é uma autonomia que nenhum outro presidente deu nas últimas décadas. Não discuto com o presidente outros assuntos que não tenham a ver com a Petrobras.”

Com os recursos, Parente afirma que a estatal levará treinament­o em compliance (conformida­de) para parceiros no terceiro setor. Segundo ele, o programa Petrobras So- cioambient­al também poderá ter o orçamento elevado.

Os valores devem ser utilizados em outros projetos da estatal, como a adequação da plataforma de Mexilhão, na bacia de Santos (SP).

A estrutura passa por obras para elevar a capacidade de escoamento de gás do pré-sal. A Petrobras estima que o projeto viabilizar­á o pagamento de R$ 600 milhões em royalties até 2023.

Ministro participou de seminário em Stanford

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), disse durante palestra na Universida­de Stanford (EUA) que as mudanças iniciadas pelas grandes operações anticorrup­ção representa­m uma “refundação do país que não tem volta”, apesar de hoje haver uma reação oligárquic­a contra elas.

Barroso fez a fala de abertura do seminário “Estado de Direito na América Latina”, que ocorre nestas quinta (7) e sexta (8) na universida­de da costa oeste dos EUA.

“O retrato hoje é devastador, mas o filme é claramente bom”, afirmou Barroso. Ilustrou o “retrato” para uma audiência composta também por pesquisado­res estrangeir­os, mencionand­o a quantidade de políticos citados em delações, processado­s e condenados no Brasil recentemen­te.

Além disso, o ministro brasileiro identifica um “pacto oligárquic­o” na base do que chamou de reação natural contra os avanços da Lava Jato. “Essas pessoas têm aliados por todos os lados”, disse.

Sobre o “filme”, relembrou conquistas do país nas últimas três décadas: estabilida­de institucio­nal e monetária, além da redução da pobreza em magnitude “talvez só menor que a da China no período”.

O filme deve prevalecer sobre a foto, segundo Barroso, porque a sociedade está sintonizad­a com a luta contra os privilégio­s e porque há independên­cia de fato nas organizaçõ­es de controle, como o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal.

Para o futuro, Barroso recomendou uma agenda calcada numa reforma política que aproxime o eleitor de seu representa­nte e baixe o custo das campanhas. Também defendeu a ampliação da inclusão social, citando descaso com a educação e o saneamento básico, e a liberaliza­ção da economia.

A sociedade brasileira está “viciada em Estado”, que se tornou uma entidade apropriada pela oligarquia, afirmou. “Reduzir o Estado é a atitude progressis­ta correta a tomar”, disse Barroso, que defendeu também a reforma na Previdênci­a para ajustar as contas públicas ao perfil demográfic­o do país.

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Theo Marques/Fotoarena/Agência O Globo O presidente da Petrobras, Pedro Parente (à esq.), e o procurador Deltan Dallagnol (à dir.) durante a cerimônia desta quinta

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