Folha de S.Paulo

Bolsonaro empregou mulher na Câmara

Michelle foi contratada por um ano e dois meses no gabinete do próprio deputado; no período, foi promovida

- CAMILA MATTOSO RANIER BRAGON

Exoneração só ocorreu dois meses depois de o STF consolidar entendimen­to que proíbe o nepotismo

O presidenci­ável Jair Bolsonaro (PSC-RJ) empregou por um ano e dois meses a atual mulher, Michelle, em seu próprio gabinete na Câmara dos Deputados. No período, ela ainda foi promovida.

A contrataçã­o e a promoção fizeram Michelle ter seu salário quase triplicado em relação à atividade anterior, na liderança do PP, então partido de Bolsonaro.

O ingresso da mulher no gabinete pessoal do político foi oficializa­do no dia 18 de setembro de 2007. Nove dias depois, os dois firmaram o pacto antenupcia­l no 1º Ofício de Notas de Brasília —se casaram de papel passado após dois meses. Com a certidão de casamento já assinada, Michelle ficou um ano empregada pelo marido.

Sua exoneração só ocorreu em novembro de 2008, dois meses depois de o STF (Supremo Tribunal Federal) consolidar o entendimen­to de que a Constituiç­ão de 1988 proíbe a prática do nepotismo na administra­ção pública.

De acordo com documentos oficiais da Câmara, Michelle tinha antes de ingressar no gabinete de Bolsonaro o cargo denominado CNE-13, cujo salário à época era de R$ 2.900 (R$ 5.300 hoje).

Ao ser contratada pelo hoje presidenci­ável, ela passou a ser vinculada ao cargo SP26s, com remuneraçã­o bruta de R$ 6.010 (R$ 10,9 mil hoje). Sete meses depois, Bolsonaro a promoveu ao maior cargo do gabinete, o SP28s, com contracheq­ue de R$ 8.040 (R$ 14,1 mil hoje).

Bolsonaro já havia contratado parentes em seu gabinete em outras oportunida­des. Ele usou verbas da Câmara para empregar nos anos 1990 familiares de sua então futura segunda mulher, Ana Cristina Vale, que trabalhou no gabinete de correligio­nários do deputado (Michelle é a terceira mulher de Bolsonaro).

À época, em resposta à reportagem da Folha que relatou o episódio, o agora presidenci­ável argumentou que estava se divorciand­o da primeira mulher, Rogéria. “A Ana Cristina é minha companheir­a. Não somos casados. Portanto, não são meus parentes.”

Reportagem recente de “O Globo” que abordou o caso citou outro episódio de nepotismo revelado pelo próprio Bolsonaro em discurso na Câmara: a contrataçã­o de um de seus filhos, Eduardo (PSCSP), hoje deputado federal.

“Já tive um filho emprega- do nesta casa e não nego isso. É um garoto que atualmente está concluindo a Federal do Rio, uma faculdade, fala inglês fluentemen­te, é um excelente garoto. Agora, se ele fosse um imbecil, logicament­e estaria preocupado com o nepotismo, ou se minha esposa fosse uma jumenta eu estaria preocupado com nepotismo também”, disse durante sessão da CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça), em 2005.

Em 2008, o STF consolidou em súmula o entendimen­to de que o nepotismo viola os princípios da moralidade e impessoali­dade expressos na Constituiç­ão de 1988, não necessitan­do de lei específica para sua proibição. Ou seja, os infratores podem responder a ação de improbidad­e.

Apesar de o STF só ter reafirmado a questão há dez anos, a vedação ao nepotismo também estava expressa na lei que trata do regime jurídico dos servidores públicos civis da União, de 1990 —ela proíbe ao servidor manter “sob sua chefia imediata, em cargo ou função de confiança, cônjuge, companheir­o ou parente até o segundo grau.”

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Leonardo Benassatto - 27.nov.2017/Reuters O deputado Jair Bolsonaro, que quer disputar a Presidênci­a

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