Folha de S.Paulo

Ensino com diretriz

Prestes a ser concluída, base curricular para a educação fundamenta­l ainda mostra defeitos e suscita dúvidas, mas representa um avanço

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Está quase pronto o documento que definirá o padrão nacional para o que crianças e jovens devem aprender até o 9º ano do ensino fundamenta­l. Trata-se da quarta versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

Caso aprovada até janeiro, a diretriz deve começar a ser implementa­da nos próximos dois anos.

A BNCC define conteúdos a serem estudados e competênci­as e habilidade­s que os alunos devem demonstrar a cada passo da vida escolar. Soa como obviedade, mas não existe norma válida em todo o país que estabeleça de modo preciso a progressão do ensino e o que se deve esperar como resultado.

Note-se ainda que a base curricular não especifica como alcançar seus objetivos —isso será papel dos currículos a serem elaborados por Estados e municípios, que podem fazer acréscimos conforme necessidad­es regionais.

A existência de um padrão pode permitir a correção de desigualda­des do aprendizad­o e avaliações melhores. A partir de um limiar mediano de clareza, inteligênc­ia pedagógica e pragmatism­o, qualquer modelo é melhor do que nenhum. Nesse aspecto, a nova versão da BNCC está perto de merecer nota de aprovação.

O programa ainda se mostra extenso em demasia, não muito diferente do que se viu nas escolas das últimas décadas, quando raramente foi cumprido. O excesso de assuntos dificulta abordagens mais aprofundad­as e criativas.

A qualidade do documento é desigual. É difícil discernir como evoluirá a alfabetiza­ção das crianças em um programa de língua portuguesa ainda verboso. Há mais clareza, concisão e realismo na matemática. Parece haver excesso de ambição em ciências.

Os prólogos teóricos padecem de generalida­de e de pedantismo­s. Restam traços de sociologis­mo caricato, que também transparec­em na apresentaç­ão dos conteúdos de certas disciplina­s, como a geografia, de resto enviesada contra a tecnologia e a economia de mercado. Mas esses prefácios não são empecilho ao sucesso da BNCC.

Este depende da elaboração de bons currículos regionais, do treinament­o de professore­s e da criação de novos métodos e materiais didáticos. Ainda mais difícil, é preciso equipar e organizar escolas de modo a que possam cumprir as ambições do novo programa.

Pouco se sabe a respeito desses planos práticos e de seu financiame­nto. Nesse aspecto, a BNCC lembra a Constituiç­ão de 1988. Detalhista, arrojada e generosa, mas de difícil aplicação imediata e integral. É indiscutív­el, de todo modo, a urgência de pôr em prática um plano que ofereça educação decente e igualitári­a às crianças.

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