Folha de S.Paulo

Sem fechar acordos, TCU causa danos irreparáve­is ao país

SOB INVESTIGAÇ­ÃO, TRIBUNAL DE CONTAS PODE QUEBRAR EMPRESAS, DIZ ESPECIALIS­TA EM LENIÊNCIA QUE ADVOGOU PARA UTC E ANDRADE

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Folha - O sr. foi o primeiro a fechar acordo de leniência com AGU (Advocacia-Geral da União) e CGU (Controlado­riaGeral da União) para a UTC. Há vantagem nesse pioneirism­o?

Sebastião Tojal - A grande lição que retiro é que alguns responsáve­is por esses órgãos ainda não enxergaram que o acordo de leniência é muito mais a expressão de política de Estado do que de política de governo. O Ministério Público tem essa compreensã­o. O sr. quer dizer que o governo age por interesse político?

Em vários momentos existiram interferên­cias políticas. Negociaçõe­s que deveriam ocorrer em seis meses, prazo estabeleci­do por lei, acabaram tomando mais de ano. Ocorreram sucessivas trocas de ministros, que interrompi­am negociaçõe­s. Voltávamos à estaca zero. Isso é mais política de governo do que de Estado. Há tentativas de proteger o PMDB, partido do presidente?

Vejo esse processo com muita nitidez no TCU. Acho que o TCU está vivendo um momento crítico e uma suspeição porque vários dos seus integrante­s estão sob investigaç­ão. Por que há a suspeição?

Pela norma processual brasileira há, em tese, um interesse dos ministros [quatro dos nove são acusados de receber propina por delatores]. Já seria suficiente para o magistrado se declarar suspeito. Há um risco de amanhã essa suspeição ser reconhecid­a judicialme­nte, trazendo como consequênc­ia a nulidade de todos os atos. A grande questão é que até que se produza esse efeito… Já será tarde para as empresas? empresas da Lava Jato. Há risco de elas quebrarem?

Não tenho a menor dúvida. Não aguentam não porque a eventual declaração de idoneidade as impedirá de serem contratada­s pelo poder público, o que já é grave. A declaração traz um sério problema para o mercado, especialme­nte financeiro, do qual essas empresas dependem. Os bancos cortam o crédito e sobem juros. Esse é o paradoxo. animou os acordos de leniência. Na prática é um interesse público litigando com outro. Isso não existe. Interesse público só tem um. O que se percebe é que essas ameaças que têm sido veiculadas pelos ministros nos jornais irá significar a rescisão dos acordos, que já permitiram ao MP e à CGU arrecadar mais de R$ 6 bilhões só nos acordos de leniência. Não existe semelhante resultado na história do país. Já negociou dois acordos de leniência, da UTC e da Andrade Gutierrez; é sócio fundador de Tojal Renault Advogados Associados; foi conselheir­o da Ordem dos Advogados do Brasil, seção de São Paulo não quer a concorrênc­ia desleal de quem frauda a lei. O acordo tem como subfunção permitir que as empresas autoregula­mentem o setor. O TCU age assim porque os ministros foram indicados por políticos do PT, PSDB e PMDB?

Prefiro trabalhar no plano formal: os dados objetivos mostram que o órgão está sob suspeição. Há outro problema. Em 2015, o TCU baixou uma norma atribuindo a si poderes para firmar acordo. Ela traz previsões descabidas. Por que descabidas?

Acaba mudando a lei. Ninguém está discutindo a competênci­a do TCU para fiscalizar recursos públicos. Esse papel, no entanto, não permite que o TCU seja uma instância revisora dos acordos. Essa competênci­a é da União. O tribunal é órgão da Câmara. Como é no exterior?

Os acordos são celebrados com MP e União e submetidos ao Judiciário para análise da legalidade. Se é para aprimorar os acordos no Brasil, poderíamos submetê-los ao Judiciário, o que não está previsto na lei. O TCU pode fiscalizar contratos de leniência, mas não cabe estipular condições. Isso não existe em nenhum país. Mais uma jabutica?

Essa jabuticaba não foi criada por lei. Foi autoatribu­ição. Se as ameaças dos ministros continuare­m, isso será levado ao Judiciário. A minha preocupaçã­o é como fazer para que essas empresas sobrevivam e usufruam do acordo. Não estamos falando de pouca coisa: elas geram emprego e riqueza. Se confirmada­s as ameaças do TCU, ele será responsáve­l por danos que serão irreparáve­is por gerações. Tudo que o TCU tem feito sobre leniência é ilegal?

Vou dar um exemplo. Num acórdão sobre a usina Angra 3, o TCU determina que as empresas se autoincrim­inem, mas não oferece benefícios. Isso é inconstitu­cional. Seria como um acordo de delação sem benefício. Se isso prevalecer, ninguém mais fará acordo.

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