Isso não é isso
Não raro, o incompreensível passa por genial; muitos artistas têm baseado toda a sua carreira neste fenômeno
A VIDA é um paradoxo. E, ao mesmo tempo, não é. (Viu o que eu fiz? Ah, ah!) O filósofo chinês ChuangTzu disse que “a felicidade perfeita é a ausência da busca da felicidade”. Fiquei feliz quando o soube, mas foi coisa rápida. Depressa recuperei o meu estado depressivo. Porque se eu parar de buscar a felicidade, estarei na verdade a fazê-lo com o objetivo de obter a felicidade, seguindo a recomendação de ChuangTzu, e nesse caso a ausência da busca da felicidade transforma-se numa busca da felicidade. Não sei se me fiz entender, mas entretanto já me dói a cabeça.
A constatação de que a vida é composta de flagrantes contradições tem tido em mim um efeito bastante contraditório: por um lado, fico satisfeito com a lucidez da observação sobre a vida; depois, verifico que cada vez entendo menos da vida.
Dou um exemplo: há gente que se suicida porque o mundo não as compreende. Ora, eu não compreendo que uma pessoa se suicide porque não a compreendem. Que alguém se suicide por causa de uma dívida, de um desgosto, ou por ser fisicamente parecido com Ernest Borgnine, aceita-se, mas atentar contra a própria vida alegando a incompreensão do mundo é apenas estúpido.
Pela minha parte, mais depressa me suicidaria se o mundo me compreendesse. É bom não esquecer que o mundo compreende perfeitamente, digamos, Michel Teló. Mas ainda hoje o mundo está para saber o que é que Shakespeare queria dizer quando escreveu que “a vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e de fúria, e que não significa nada”.
Isto parece-me revelador. De quê, não sei. Mas uma coisa é certa: a compreensão do mundo tem sido muito sobrevalorizada. Ser incompreendido traz, até, grandes vantagens. A maior parte das pessoas têm uma consciência muito vívida da sua própria burrice, pelo que tende a considerar inteligente tudo aquilo que não consegue compreender —atitude que acaba por ser ajuizada. Isto significa que, não raras vezes, o incompreensível passa por genial. Muitos artistas plásticos contemporâneos têm baseado toda a sua carreira neste fenômeno.
A grande questão que se coloca é, no fundo, esta: será sensato querer ser compreendido pelo mundo? Bom, sabendo que Campinas faz parte do mundo, a resposta só pode ser negativa. Compreendem? Espero que não.