Folha de S.Paulo

Sistema em ruínas

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SÃO PAULO – O problema não é a Lava Jato nem as operações destrambel­hadas da PF em universida­des. O problema são a Justiça, o MP, a PF e outras polícias como um todo.

É claro que a Lava Jato, apesar de seu saldo amplamente positivo, cometeu abusos. É claro que as conduções coercitiva­s são uma palhaçada, mesmo quando precedidas de intimação. Num país cuja Constituiç­ão assegura a réus e suspeitos o direito de permanecer em silêncio, leválos para depor “manu militari” não passa de um exercício de exibicioni­smo narcísico e um enorme desperdíci­o de gasolina pública.

Se o cidadão diz que não vai falar nada, a única coisa sensata a fazer é deixá-lo em paz e registrar que ele invocou o direito de não produzir prova contra si mesmo. Obviamente, isso também vale para CPIs.

Parece-me um erro, porém, atribuir as exorbitânc­ias de juízes e investigad­ores a especifici­dades da Lava Jato ou das operações em universida­des. Os excessos de juízes, pro- motores e policiais são a regra geral do sistema. Se for para arriscar um palpite, diria até que os empresário­s, políticos e professore­s agora investigad­os são tratados com mais reverência do que o cidadão médio na mesma situação.

A melhor prova de que é o sistema todo que é disfuncion­al vem dos recém-divulgados dados da população carcerária. No Brasil, 40,2% das quase 700 mil pessoas que estão atrás das grades são presos provisório­s, isto é, sem uma condenação.

É ótimo que a sociedade civil acorde para o grave problema dos abusos judiciais, mas seria lamentável se a indignação resultasse em mudanças apenas para réus da Lava Jato e de operações similares, deixando de lado a massa carcerária.

A verdade é que o sistema está tão podre que, hoje, quanto mais gente nós prendemos, mais recrutas oferecemos às organizaçõ­es criminosas que operam nas cadeias. helio@uol.com.br

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