Folha de S.Paulo

Nova lei de falências ‘empodera’ bancos

Projeto permite que credores, normalment­e do setor financeiro, apresentem plano de recuperaçã­o e indiquem gestores

- RAQUEL LANDIM

Fisco também tem a sua força ampliada; poderá pedir a falência do devedor e até impedir a venda de ativos

A nova lei das falências do governo Michel Temer vai permitir que os bancos troquem a gestão e assumam o comando das empresas em recuperaçã­o judicial. Em geral, as instituiçõ­es financeira­s são os maiores credores nesses processos.

O projeto foi elaborado pelo Ministério da Fazenda e já está na Casa Civil, aguardando apenas a votação da reforma da Previdênci­a para ser enviado ao Congresso.

A expectativ­a da área técnica é que a nova legislação entre vigor ainda na atual gestão, mas os empresário­s prometem mobilizar suas bancadas para alterar o projeto ou mesmo derrubá-lo por considerar a versão final mais um risco do que uma solução para um momento de dificuldad­es financeira­s.

Segundo a última versão do texto, à qual a Folha teve acesso, o prazo para que o acionista controlado­r apresente o plano de recuperaçã­o de uma companhia é reduzido de 180 dias para 120 dias, sem a possibilid­ade de renovação.

Caso o devedor não consiga aprovar seu plano na assembleia de credores ou perca o prazo, credores que represente­m pelo menos 1/3 da dívida da empresa ganham o direito de apresentar seu próprio plano —o que pelas regras de hoje é vedado.

Além disso, se esse novo Apenas o acionista. Se o plano não for aprovado pelos credores, é preciso renegociar ou a empresa vai à falência Não estão sujeitos à recuperaçã­o judicial. As Receitas federal e estaduais parcelam o pagamento do valor integral da dívida em até 84 vezes, mas, na prática, os juízes têm permitido que as empresas não paguem o fisco Juiz pode aprovar que a empresa receba um aporte para tentar sair da crise. Esse empréstimo tem preferênci­a para receber, com exceção das dívidas que estão fora da recuperaçã­o judicial plano receber o aval da assembleia, a gestão da empresa é automatica­mente destituída e os credores podem indicar novos administra­dores.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já disse publicamen­te que a nova lei de falências representa um “empoderame­nto” dos credores, para preservar a companhia e os empregos, em vez de proteger os acionistas devedores.

Para advogados tributaris­tas, as mudanças beneficiam os bancos e prejudicam as empresas. “Caso essa lei seja aprovada, as empresas vão desistir de entrar em recuperaçã­o judicial e sangrar até falir”, diz Ivo Waisberg, do Thomaz Bastos, Waisberg e Kurzweil Advogados.

A atual lei de falências foi promulgada em 2005 e é considerad­a por especialis­tas um avanço em relação à legislação anterior, que não previa a recuperaçã­o judicial, mas apenas uma concordata.

A avaliação do atual governo, no entanto, é que os resultados não foram satisfatór­ios para os credores. Para cada R$ 1,00 que entra na recuperaçã­o judicial no Brasil, os credores recebem apenas R$ 0,25. Na Colômbia, chega a R$ 0,60, e a média na América Latina é de R$ 0,45.

A discussão da nova legislação começou em agosto de 2016 e foram ouvidos acadêmicos, advogados e associaçõe­s de classe. A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) participou ativamente do processo.

O novo projeto de lei tem 55 páginas e altera cerca de 80% da legislação atual.

“Pode mudar a lei inteira, o que traz enorme inseguranç­a jurídica, porque uma legislação não é só o que está escrito na Constituiç­ão, mas também a jurisprudê­ncia que vai sendo criada”, diz Eduardo Munhoz, do E. Munhoz Advogados. Procurada pela reportagem a Febraban, entidade que representa os bancos, não se pronunciou. RECEITA Outro credor que ganha força no projeto de lei elaborado pelo Ministério da Fazenda é o fisco, que terá direito de pedir a falência das empresas e de impedir a venda de ativos.

Hoje os créditos fiscais ficam de fora da recuperaçã­o judicial, o que significa que não sofrem com os descontos que são aplicados a outros credores. Existe apenas um parcelamen­to em até 84 vezes. Na prática, no entanto, o fisco não tem recebido praticamen­te nada.

Isso ocorre porque os juízes vêm permitindo que as empresas não paguem os créditos fiscais para que possam ganhar fôlego financeiro.

Pela nova lei, o prazo do parcelamen­to também é alterado. Sobe para 120 vezes, mas o fisco ganha o direito de pedir a falência caso a dívida não seja paga.

Apesar de os créditos fiscais continuare­m fora da recuperaçã­o judicial, as Receitas federal e estaduais terão voto na assembleia de credores e poderão impedir que a empresa venda ativos para levantar capital.

Se forem aprovadas no Congresso, essas novas regras podem ser utilizadas em recuperaçõ­es judiciais em andamento. Técnicos do governo, porém, não acreditam que o projeto de lei seja promulgado a tempo de influencia­r processos polêmicos como os da Oi e da Sete Brasil.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil