Folha de S.Paulo

Será que foi só brincadeir­inha?

- MIRIAN G OLDENBERG

UMA QUEIXA frequente dos meus pesquisado­s está relacionad­a a alguns comentário­s “inofensivo­s” e “brincadeir­inhas” que são muito comuns entre os casais.

Uma figurinist­a de 42 anos disse que o namorado tem a mania de dizer que “todas as mulheres bonitas que namorou só provocaram sofrimento”.

“Ficava incomodada com o jeito que ele fala das ex-namoradas. Até que conheci uma delas: uma loira fake de cabelos alisados até a cintura. O que mais me chocou foi o shortinho minúsculo, apesar de ela ter mais de 50 anos e as pernas gordas, flácidas e esburacada­s. Bem do tipo que se acha gostosa e quer se fazer de garotinha, mas é brega, ridícula e vulgar.”

Quando o namorado falou mais uma vez das ex-namoradas bonitas, ela perguntou: “Isso significa que eu não sou bonita?”.

Ele respondeu: “Você está sensível demais. Não foi isso que eu quis dizer, não tive a intenção de ofender. Em vez de dizer bonita, devia ter dito exuberante, aquela mulher que todo homem olha e me deixa inseguro”.

A emenda saiu pior que o soneto. Sentindo-se diminuída, ela questionou: “Quer dizer que ninguém me olha? Sou invisível?”.

Homens também reclamam de comentário­s que ferem “sem intenção”.

Um engenheiro de 57 anos contou que a esposa não trabalha. Ele sempre pagou todas as despesas da casa, além de dar muitos presentes para ela: carro novo, celulares, roupas etc. Em um passeio no shopping, logo após ele ter comprado uma bolsa para a esposa, ela perguntou: “Você vai me dar o sapato de presente?”. Ele disse que não, pois precisava controlar os gastos.

Ela reclamou: “pão duro, muquirana”. Ele ficou perplexo, mas nada disse. Ela insistiu: “muquirana, mão de vaca”. Ele, então, explodiu e disse que achava um absurdo ela não reconhecer tudo o que ele fazia.

Ela reagiu: “Nossa, que exagero, como você é mal-humorado. Foi só uma brincadeir­inha”.

É curioso perceber como a pessoa que se sente magoada com esses comentário­s ou “brincadeir­inhas” é frequentem­ente acusada de ser sensível demais, exagerada, louca, histérica, neurótica, mal-humorada etc. E aquele que ofende costuma usar a desculpa de que foi só uma “brincadeir­inha”.

Mas, se fosse realmente só uma “brincadeir­inha”, todos deveriam achar graça, não é verdade?

Homens e mulheres reclamam de comentário­s do(a) companheir­o(a) que, ‘sem intenção’, ferem

Mirian Goldenberg miriangold­enberg@uol.com.br

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