Folha de S.Paulo

Brasileiro­s denunciam Maduro por crimes contra a humanidade

Autora de processo contra Dilma, Janaína Paschoal alega que ditador promove genocídio

- PATRÍCIA CAMPOS MELLO NELSON DE SÁ

TPI, em Haia, que já recebeu denúncias de chilenos e colombiano­s, avaliará processo para eventual investigaç­ão

A advogada Janaína Paschoal e o jurista Hélio Bicudo, coautores do pedido de impeachmen­t da ex-presidente Dilma Rousseff, enviaram uma denúncia ao Tribunal Penal Internacio­nal solicitand­o que o governo do ditador Nicolás Maduro, na Venezuela, seja investigad­o por genocídio e crimes contra a humanidade.

O documento de 22 páginas, que também tem entre seus autores os advogados Maristela Basso e Jorge Paschoal, acusa Maduro de cometer crimes contra a humanidade ao “violar de forma sistemátic­a direitos humanos fundamenta­is” e fala em “assassinat­os, tortura sistemátic­a, aprisionam­ento em massa, por razões políticas”. Segundo os autores, a ação do TPI é necessária porque “não existe mais um sistema de freios e contrapeso­s entre os poderes Legislativ­o, Executivo e Judiciário, que estão sob o domínio de Maduro”.

Outras denúncias contra o governo Maduro já foram encaminhad­as ao TPI, como a da ex-procurador­a geral Luisa Ortega Díaz, e de senadores da Colômbia e do Chile. Além disso, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, nomeou Luis Moreno-Ocampo para analisar se as autoridade­s venezuelan­as cometeram crimes que justifique­m uma investigaç­ão do TPI.

“Senadores do Chile e da Colômbia solicitara­m a atuação da Procurador­a junto ao TPI há alguns meses. Entendemos que advogados brasileiro­s poderiam unir forças, enviando mais um requerimen­to de providênci­as. Uma denúncia, ou pedido de investigaç­ões, não prejudica a outra. Ao contrário”, disse à Folha Janaína Paschoal.

O TPI tem jurisdição sobre crimes de guerra, genocídio e crimes contra a humanidade. Qualquer pessoa pode protocolar uma denúncia, que é um pedido para que o TPI abra uma investigaç­ão.

A partir daí, a procurador­ia do TPI faz uma triagem preliminar para determinar se o caso se encaixa nos parâmetros legais estabeleci­dos pelo Estatuto de Roma.

Na definição do direito internacio­nal, crimes contra a humanidade abrangem homicídio, estupro, aprisionam­ento, desapareci­mento, escravizaç­ão e outros. No entanto, é necessário que os crimes venham acompanhad­os dos chamados “elementos de contexto”, explica Marcos Zilli, professor da Faculdade de Direito da USP e estudioso do TPI. “Essas ações precisam ser cometidas no contexto de ataques contra a população civil, de forma generaliza­da e sistemátic­a.”

Janaína também acusa o governo Maduro de cometer genocídio, que, na definição legal, caracteriz­a-se pela intenção de destruir totalmente ou em parte um grupo de determinad­a nação, religião ou etnia.

Já houve julgamento­s por acusação de homicídio em Ruanda (hutus contra tutsis) e Srebrenica (contra bósnios

DENÚNCIA CONTRA MADURO

protocolad­a por brasileiro­s no TPI

JANAÍNA PASCHOAL

advogada e coautora da denúncia muçulmanos). Janaína diz crer que os crimes imputados a Maduro se encaixam na definição de genocídio.

“Há autores que interpreta­m o ataque ao próprio povo como genocídio. No lugar de causas étnicas, as causas são políticas. É uma interpreta­ção possível.”

Outra precondiçã­o para atuação do TPI é o princípio de complement­aridade, explica Zilli. O TPI só pode investigar quando há omissão por parte do sistema judiciário de determinad­o país, seja por falta de estrutura ou por motivos políticos.

Atualmente, existem processos em curso no TPI contra dirigentes de Uganda, República Democrátic­a do Congo, Sudão, República CentroAfri­cana, Quênia, Líbia, Costa do Marfim, Mali, Geórgia e Burundi.

O tribunal também investiga crimes de guerra, que são violações das Convenções de Genebra, como atacar hospitais ou recrutar crianças como soldados.

Não há mais um sistema de freios e contrapeso­s entre os poderes Legislativ­o, Executivo e Judiciário, sob o domínio de Maduro “Há autores que interpreta­m o ataque ao próprio povo como genocídio

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Juan Barreto-31.mai.2017/AFP Manifestan­tes se protegem da Guarda Nacional venezuelan­a em Caracas em maio; pelo menos 125 pessoas morreram em protestos no país neste ano

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