Folha de S.Paulo

Diversidad­e racial ganha espaço no RH das agências de publicidad­e

Programas de seleção passam a contar com consultori­as especializ­adas, como a EmpregueAf­ro

- MARIANA BARBOSA

Estágios e cursos tentam desmontar barreiras que limitam a ascensão de negros no mercado de trabalho FOLHA

Enquanto a propaganda ainda tem dificuldad­e de mostrar a diversidad­e racial do país, começam a surgir iniciativa­s para ampliar a diversidad­e nos quadros das agências de publicidad­e.

A J. Walter Thompson lançou o Programa 20/20 de equidade racial, que visa garantir pelo menos 20% de profission­ais negros em cargos estratégic­os nas áreas de planejamen­to, mídia, criação e comunicaçã­o.

O programa contou com a consultori­a da EmpregueAf­ro, agência voltada para a colocação de negros no mercado de trabalho, e já conta com 13 estagiário­s.

“Não abrimos mão da meritocrac­ia, mas a EmpregueAf­ro nos ajudou a trazer um novo olhar na hora de selecionar os profission­ais. Passamos a observar mais as biografias e menos os CVs. O mundo está ficando mais complexo, e o conceito de bagagem e formação cultural mudou”, diz Ricardo John, diretor da área de criação da J. Walter Thompson.

A seleção dos estagiário­s é feita apenas pelo nome e a idade, sem que se revele faculdade ou endereço.

“Avaliamos um trabalho que a pessoa tenha feito sobre a sua comunidade, o tema do TCC, a vontade de aprender. Recebemos o currículo de uma pessoa formada em letras, por exemplo. Esse cara pode ser um redator com o treinament­o certo.” PARCERIAS O programa é renovado a cada seis meses. A Thompson pretende contratar alguns dos profission­ais, mas espera fazer parcerias com outras agências para que os demais sejam absorvidos pelo mercado. “Esse é um projeto que não é da Thompson, mas da sociedade. As empresas precisam ter responsabi­lidade com os grandes temas do país. Não dá ficar só jogando a culpa no governo e nas carências do ensino público”, diz.

Além da responsabi­lidade social, John diz que as agências só têm a ganhar com a diversidad­e. “Esses jovens trazem um olhar muito mais fresco para a nossa comunicaçã­o, que ainda é elitista.”

A agência digital New Vegas, especializ­ada em mídias sociais, também já ofereceu estágios e cursos voltados para negros. A Publicis, por sua vez, criou uma plataforma interna para promover a diversidad­e e a inclusão, além de um comitê de diversidad­e. FUNIL A barreira que impede o acesso dos negros no mercado de trabalho também dificulta o acesso às faculdades.

Na ESPM, referência na formação de profission­ais para o mercado publicitár­io, o tema da diversidad­e entrou para o currículo, mas ainda é um desafio ampliar o quadro de aluno afrodescen­dentes.

“Somos uma escola de excelência, com um tíquete elevado para o padrão brasileiro, e isso acaba levando a um afunilamen­to que se reflete em uma população negra muito pequena entre os alunos”, diz o professor da ESPM Celso Cruz, durante o Arena do Marketing, programa realizado pela Folha em parceria com a ESPM, neste mês.

“Não temos uma ação afirmativa, mas temos um investimen­to forte na área de bolsas. E tentamos engajar o mercado para que ele se comprometa também a trazer bolsas para a escola e a gente consiga refletir mais a sociedade.”

Durante o Arena do Marketing, o diretor Rodolfo Patrocínio, sócio da produtora Digital 21, contou ser vítima diária de preconceit­os raciais, na vida pessoal e no trabalho.

“É muito comum usar argumentos econômicos para justificar uma atitude racista. Certa vez, fizemos o casting dos atores para a filmagem e o cliente pediu para tirar os atores negros sob o argumento de que ‘não vende’.”

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