Folha de S.Paulo

Sem orgulho, com amor

- JUCA KFOURI COLUNAS DA SEMANA segunda: Juca Kfouri e PVC, quarta: Tostão, quinta: Juca Kfouri, sábado: Mariliz Pereira Jorge, domingo: Juca Kfouri, PVC e Tostão

SENÃO, VEJAMOS: o Rio de Janeiro não paga seus funcionári­os, não abastece seus hospitais, e, segundo o digníssimo ministro da Justiça, Torquato Jardim, os comandante­s da Polícia Militar fluminense são cúmplices dos bandidos.

Três ex-governador­es do Estado, Sérgio Cabral Filho, Anthony Garotinho e Rosinha Matheus, estão presos ou estiveram, caso da esposa de Garotinho, que foi solta embora não possa sair de casa à noite nem com a tornozelei­ra eletrônica que carrega.

A CBF, com sede no Rio, tem um presidente paulista, Marco Polo del Nero, que se viajar será preso pela Interpol.

Seu antecessor, o também paulista e ex-governador de São Paulo, José Maria Marin, aguarda, em prisão domiciliar em Nova York, a sentença que estabelece­rá quanto tempo mais seguirá preso.

O antecessor de Marin, o mineiro Ricardo Teixeira, como o Marco Polo que não viaja, está confinado às fronteiras brasileira­s, em, por enquanto, doce exílio no próprio país.

O ex-presidente do COB e do CoRio-16, o carioca Carlos Arthur Nuzman, já teve a experiênci­a de ver a quadratura do sol e está com o passaporte aprendido.

Daí não surpreende­r que uma torcida excluída se organize para invadir o Maracanã e ver a final da Copa Sul-Americana sem pagar o alto preço dos ingressos.

Assim fez um grupo de torcedores do Flamengo, como outro causou tumulto em frente ao hotel onde estavam hospedados os jogadores do Independie­nte, mais um apedrejou o ônibus argentino no caminho do estádio e mais outro fez do entorno do campo uma praça de guerra na saída.

Tudo para coroar a temporada em que, em fevereiro, antes do clássico Botafogo x Flamengo, no Engenhão, um torcedor morreu vítima de perfuração de objeto cortante e, em julho, durante um Vasco x Flamengo, a briga foi tamanha que São Januário acabou interditad­o. Faltava o Maracanã. Pois não falta mais.

Ir a quaisquer dos três mais importante­s estádios cariocas é uma aventura não recomendáv­el a menores e maiores de 18 anos.

Se você concluiu que o elemento comum aos três episódios é o Rio, enganou-se. Porque é o Brasil. No Rio tudo está apenas mais exacerbado, porque lá a situação chegou ao fundo do poço.

Também não é o torcedor do Flamengo, outro elemento comum aos três exemplos de barbárie.

Porque ele não é diferente do corintiano, do são-paulino ou do palmeirens­e e santista.

Só tem mais certeza da ausência do Estado, da impunidade, da terra de ninguém, como no Complexo do Chapadão, o mais perigoso da Cidade Maravilhos­a.

Seria menos ruim se a selvageria estivesse restrita ao Rio, mas é o Brasil que regride a olhos vistos.

Lula está condenado em primeira instância e será o primeiro político brasileiro a ser julgado a jato em tribunal superior, o que seria boa notícia, não fosse tão óbvia a seletivida­de da Justiça.

Dilma está impedida porque pedalou e Temer preside o país à custa de comprar deputados para escapar dos rigores da lei porque, mais que pedalou, corrompeu. E foi gravado!

De onde se conclui que o nosso torcedor não tem por que cantar “sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor”.

Embora o amor sobreviva.

A falência econômica e moral do Rio transformo­u seus estádios em locais tão perigosos como o Chapadão

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