Folha de S.Paulo

Catalunha, o diálogo ou a ruína

- CLÓVIS ROSSI COLUNISTAS DA SEMANA domingo: Clóvis Rossi, segunda: Mathias Alencastro, quinta: Clóvis Rossi

O RESULTADO da eleição desta quinta-feira (21) na Catalunha já está dado —e é tenebroso.

“Temos uma sociedade cindida, polarizada, com um sistema político fragmentad­o: ninguém alcançará maioria suficiente para governar, mas todos disporão de suficiente poder e excesso de ódio para vetar”, escreve para “El País” o historiado­r e sociólogo Santos Juliá.

As pesquisas lhe dão razão: mostram que nenhum dos sete partidos que disputam a eleição chegará perto da maioria necessária para governar e que há um empate técnico entre os dois grandes blocos, 46% para os independen­tistas e 44% para os favoráveis à permanênci­a na Espanha (com a margem de erro de 3%, significa empate técnico).

A única chance de fugir à tragédia antevista por Santos Juliá está na torcida de outra colunista de “El País”, Sandra León, para quem o problema não é a ausência de maiorias claras —o que certamente ocorrerá—, mas “a ausência de maiorias competente­s (...) que não alimentem a perpetuaçã­o do conflito nem pretendam considerá-lo terminado, ignorando suas raízes”.

Que o conflito tem raízes é mais que óbvio: o nacionalis­mo catalão vem crescendo há anos e ganhou dois impulsos no período mais recente. Primeiro, a crise econômica global que maltratou profundame­nte a Espanha e fez crescer a sensação de que uma Catalunha independen­te lidaria melhor com a crise.

Depois, veio a irresponsa­bilidade das lideranças que comandavam o governo catalão, ao vender a dupla ilusão de que a independên­cia estava pronta, esperando na primeira curva da esquina e de que seria um pote de ouro na ponta do arco-íris. Essa irresponsa­bilidade provocou um estrago que a eleição, por si só, não vai desfazer.

Analisa, por exemplo, Ricardo de Querol, editor-chefe do jornal econômico “Cinco Días”:

“Barcelona era o maior polo industrial do Estado [espanhol], notável praça financeira (com mais sedes de bancos que Madri), a capital das editoras de livros em castelhano, um destino turístico sem igual; já não o é. Foram-se 3.000 empresas, incluídas as maiores: Sabadell, CaixaBank, Gas Natural, Catalana Occidente, Planeta, muitas que levavam a ‘catalanida­d’ no DNA e no nome”.

Mais: “Há dois meses consecutiv­os, o emprego piora notavelmen­te, e a Esade [universida­de de direito e negócios] diz que 46% das companhias paralisara­m investimen­tos”.

Quais as chances de que a eleição proporcion­e a “maioria competente” desejada por Sandra León?

No cenário otimista, se o bloco próindepen­dência for majoritári­o, pode ser que prevaleçam nele os moderados, que, chocados com a intervençã­o do Estado na Catalunha e convencido­s de que ela se repetirá se o novo governo insistir em desobedece­r a Constituiç­ão, imponham um ritmo negociador ao processo. Se terão um interlocut­or igualmente competente em Madri, é outra questão.

Se os constituci­onalistas saírem vitoriosos —e sempre no registro otimista—, pode ser que entendam que a sua maioria não significa que a outra metade terá deixado de ser independen­tista.

Posto de outra forma, ou se negocia, ou a Catalunha afundará ainda mais no ódio —e na ruína.

A irresponsa­bilidade dos nacionalis­tas levou a uma crise que só a negociação pode começar a dissolver

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