Por que o Grêmio não chutou
O SÃO Paulo foi campeão mundial em 2005 ao vencer o Liverpool depois de acertar apenas dois chutes no arco inglês.
Por felicidade, um deles, o de Mineiro, aos 26 minutos do primeiro tempo, venceu o goleiro Reina.
Quatro foram chutes brasileiros contra a meta do time da terra dos Beatles, contra 21 arremates de Gerrard e companhia, oito defendidos por Rogério Ceni, no que é considerada a melhor atuação na carreira do ídolo são-paulino.
Houve 17 escanteios naquela finalíssima disputada em Yokohama, no Japão, todos, repita-se, todos a favor do time britânico, que teve 53% de posse de bola.
No ano seguinte coube ao Internacional disputar a decisão do Mundial da Fifa contra o Barcelona no mesmo palco nipônico.
Também o Colorado acertou só dois chutes na baliza defendida por Valdés, gol de Adriano Gabiru, que veio do banco quando restavam 14 minutos para terminar a partida e fez o tento da vitória seis minutos depois.
Os catalães chutaram cinco vezes com precisão e ficaram com o balão por 58% do tempo.
Finalmente, em 2012, quando pela última vez um time sul-americano ganhou o título, ainda em Yokohama, o Corinthians repetiu a dose: dois chutes certos, gol de Guerrero, aos 23 minutos do segundo tempo, de cabeça, aproveitando uma bola espirrada, indefensável para Petr Cech.
O Chelsea chutou seis vezes corretamente e Cássio fez cinco defesas que lhe valeram, como aconteceu com Rogério Ceni, o prêmio de melhor em campo.
Os súditos da Rainha permaneceram por 54% do jogo com a bola.
Nem o mais são-paulino dos sãopaulinos, ou o mais colorado dos colorados, ou, ainda, o mais corintiano dos corintianos, se atreverão a dizer que seus times eram melhores que o Liverpool, que o Barcelona ou que o Chelsea. Mas foram os indiscutíveis campeões, também porque numa arbitragem exemplar, o Liverpool teve nada menos que três gols bem anulados, um por impedimento fácil de ser marcado, outro por falta de Morientes no goleiro tricolor e mais um em impedimento dificílimo de ser observado.
Verdade que houve um pênalti no lateral-esquerdo Júnior do time do Morumbi não observado pelo apitador mexicano. Verdade, também, que no contra-ataque do lance não assinalado, Lugano quase quebrou a perna de Gerrard num carrinho digno de punir o autor com cartão vermelho.
Se o Grêmio abusou da inoperância contra o esquadrão do Real Madrid, nem por isso sua atuação foi assim tão diferente das dos três bem-sucedidos times nacionais.
Os madridistas acertaram sete arremates, ficaram 65% do tempo com a redonda e Cristiano Ronaldo fez o gol do título, porque Barrios teve medo de levar uma bolada e abriu a barreira.
Pode uma equipe disputar um decisão mundial e não chutar nem uma vez sequer com precisão? Não, não pode, é óbvio. Além do respeito exagerado, que vira covardia, da diferença técnica abissal, há de se levar em conta a incapacidade de suprir coletivamente a inferioridade de talento contra a excelência de uma verdadeira legião estrangeira de estrelas.
Acabar com o Mundial é quebrar o termômetro em vez de cuidar da febre.
O futebol brasileiro parou no tempo.
Ainda é motivo de perplexidade o fato de o time brasileiro não ter acertado uma bola no gol