Folha de S.Paulo

Formação

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mestre e doutor em ciências do solo pela Universida­de da Califórnia O senhor já esteve no Brasil?

De férias, mas nunca estudei a fundo as questões agrárias do país. Conheço algo sobre o cerrado e a alta produtivid­ade de milho e soja na região. Sei que há problemas, mas não os conheço a fundo. Já ouviu falar de sistemas integrados que, ao mesmo tempo, promovem o cultivo de lavoura, pecuária e floresta?

Na Austrália, na Nova Zelândia e em partes da Europa, fala-se muito em sistemas integrados e mistos. Sistemas integrados mesclam agricultur­a convencion­al e orgânica, e os mistos são interações entre plantas e animais. Seus trabalhos o levaram a pesquisar mais de mil fazendas em quatro continente­s. Que lições podemos tirar?

Sempre procurei comparar diferentes sistemas agropecuár­ios —convencion­ais, orgânicos, biodinâmic­os, integrados e plantio direto.

A grande força do método convencion­al é que ele é capaz de atingir altos patamares de produção. Sua maior falha são os impactos ambientais.

Sistemas orgânicos são, em média, 15% a 20% menos produtivos do que os convencion­ais. Ainda assim, são mais rentáveis, porque conseguem preços mais vantajosos no mercado. Também são vantajosos em quesitos como qualidade do solo, demanda energética, uso de pesticidas e geração de emprego. O senhor acredita que a produção de alimentos será cada vez mais regionaliz­ada?

Na maioria das regiões, é possível conseguir frutas e vegetais produzidos localmente, mas regiões frias podem ter dificuldad­es.

O maior entrave é a compra de grãos, que nem sempre têm produção local. Sem importação, muitos lugares teriam dificuldad­e em atender a demanda, principalm­ente porque essas fazendas tendem a ocupar grandes áreas. Grãos compõem 70% de nossas dietas, mas a maioria da produção vai para a alimentaçã­o animal, o que é ineficient­e. Alimentaçã­o animal é o destino da maior parte da produção brasileira de grãos. Como o senhor analisa esse cenário?

Tudo bem destinar uma parte das terras à produção de grãos para alimentaçã­o animal, mas a maior porção das terras agricultáv­eis deveria ser reservada ao plantio de grãos que nós, humanos, comemos.

É fácil culpar os fazendeiro­s ou corporaçõe­s, mas grande parte da responsabi­lidade é dos consumidor­es. Em países menos desenvolvi­dos, consome-se cada vez mais carne. Isso é um problema. Tem sido uma demanda de consumo. Em artigo da “Nature Communicat­ions”, calcula-se que seria viável converter toda a cadeia agroalimen­tar para o sistema orgânico, desde que acabasse o desperdíci­o de alimento e fosse reduzido o consumo de carne. O que acha?

Soube da publicação e conheço o autor do estudo. Outro trabalho analisou diferentes tipos de dieta e constatou que, se todos adotássemo­s hábitos alimentare­s veganos, poderíamos chegar a uma população de 9,6 bilhões de pessoas em 2050 sem precisar abrir novas áreas de plantio —mas as pessoas não se tornarão todas veganas.

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