Folha de S.Paulo

Procurador­ia vai renegociar acordo de leniência da JBS

Autoridade­s incluirão crime de informação privilegia­da, o que pode aumentar a multa

- FÁBIO FABRINI CAMILA MATTOSO

O estaleiro Keppels Fels fechou um acordo de leniência nesta sexta-feira (22) com autoridade­s do Brasil, dos Estados Unidos e de Cingapura, onde fica a sua sede, no qual reconhece que pagou propina para fornecer navios e plataforma­s de petróleo para a Petrobras e a Sete Brasil. A empresa vai pagar um multa de R$ 1,4 bilhão.

Leniência é uma espécie de delação para empresas.

O Brasil ficará com cerca da metade do valor da multa (R$ 692 milhões), segundo a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba.

A multa global é a terceira maior da Lava Jato (depois de Odebrecht e da Braskem) e a quinta no ranking de dinheiro que será pago ao Brasil.

O acordo estipula que a empresa de Cingapura devolverá o dobro do que pagou em suborno no país.

O Keppels é um dos maiores fornecedor­es da Petrobras e tem contratos no valor de US$ 25 bilhões, o equivalent­e atualmente a R$ 83 bilhões.

A ordem para o pagamento de propina partia da cúpula da empresa em Cingapura. O acordo envolveu os EUA porque um executivo americano participou do esquema paga pagar suborno.

O estaleiro era representa­do no Brasil pelo lobista Swi Skornicki, que foi apanhado pela Lava Jato, fez acordo de delação e reconheceu ter pago US$ 4,5 milhões ao marqueteir­o do PT João Santana, por indicação do ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto, que está preso em Curitiba.

A mulher de Santana, a publicitár­ia Mônica Moura, informou em sua delação que o dinheiro foi recebido na Suíça e era uma dívida de campanha presidenci­al de Dilma Rousseff de 2010.

O lobista contou em seu acordo que fez pagamentos de propina para executivos da Petrobras e para o PT desde 2003. Ele pagou uma das maiores multas entre os delatores da Lava Jato, de R$ 83,1 milhões.

No ano passado, a empresa reconheceu que poderia ter ter cometido ilicitudes em negócios com a Petrobras.

Com esse acordo, o valor arrecadado pela Lava Jato em três anos e nove meses sobe para R$ 11,5 bilhões, um recorde na história brasileira.

“Infelizmen­te, esse valor ainda é pequeno quando comparado ao total desviado da população brasileira pela atuação de políticos, agentes públicos e empresário­s corruptos. Muito mais ainda precisa ser feito para coibir essa prática nefasta”, disse a procurador­a Laura Gonçalves Tessler, da força-tarefa.

O advogado da Keppels, Celso Vilardi, não quis se pronunciar. (MARIO CESAR CARVALHO)

O MPF (Ministério Público Federal) em Brasília vai reabrir a negociação do acordo de leniência com a J&F, holding que controla a JBS. O objetivo é discutir a admissão de responsabi­lidade no uso de informaçõe­s privilegia­das para obter lucros indevidos (insider trading).

A suposta prática desses ilícitos levou os irmãos Joesley e Wesley Batista para a prisão há pouco mais de três meses. A leniência —espécie de delação premiada de empresas— já havia sido fechada quando o caso passou a ser investigad­o.

As novas tratativas levariam à assinatura de um adendo aos termos já acertados. Se houver consenso, o grupo terá de pagar mais do que os R$ 10,3 bilhões já pactuados com a Procurador­ia da República no Distrito Federal.

O MPF em São Paulo denunciou os irmãos Batista por usarem informação de seu próprio acordo de colaboraçã­o, que ainda não havia sido divulgado, para obter vantagens ilícitas com operações financeira­s.

Na acusação, os procurador­es sustentam que o grupo deixou de ter um prejuízo de US$ 100 milhões com a compra de dólares e de US$ 138 milhões com a negociação de ações. A renegociaç­ão entre procurador­es e defesa, já tratada informalme­nte, deve começar em janeiro.

A questão tem dividido advogados da JBS. Teme-se que, ao admitir a infração na leniência, a situação criminal dos irmãos se complique. Há um pedido de liberdade ainda a ser julgado.

Toda a argumentaç­ão para o habeas corpus e também para defesa na denúncia se baseia no fato de que não houve crime. Há uma série de pareceres de especialis­tas que dão a versão de que o episódio não pode ser considerad­o ilícito penal.

Um dos caminhos aventados pela defesa é reconhecer que houve infrações mais brandas, não os crimes levantados pelo MPF.

Os advogados do grupo alegam que a CVM (Comissão de Valores Imobiliári­os), ao abrir um processo sobre a atuação de Wesley, sinalizou que houve uso de uma vantagem indevida por parte envolvida. Essa conduta configura falta administra­tiva, mas não o crime de insider trading, argumentam.

Outra saída seria reconhecer que a pessoa jurídica teve culpa ao não adotar procedimen­tos para evitar operações no período em que a delação era feita, mas sem admitir a intenção de ganhar dinheiro ilicitamen­te. A J&F, procurada, não comentou.

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Renzo Gostoli - 21.ago.2008 / Bloomberg News A plataforma P-51, da Petrobras, em Angra dos Reis (RJ), do estaleiro Keppels-Fels

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