Folha de S.Paulo

Cota nacional ‘inibiria’ vídeo sob demanda

Recém-nomeado para presidir a Ancine, Christian de Castro diz que ainda é cedo para regulament­ar o streaming

- GUILHERME GENESTRETI

Gestor é apadrinhad­o do ministro da Cultura, criticado por parte do setor por ‘beneficiar’ cinema mais comercial

Ainda é cedo para regulament­ar a atuação dos serviços de vídeos sob demanda no Brasil, defende Christian de Castro, nomeado na última terça (2) por Michel Temer para presidir a Ancine (Agência Nacional do Cinema).

“Esse mercado ainda está em fase de consolidaç­ão”, diz, em entrevista à Folha. Segundo ele, “sobrerregu­lá-lo” neste momento “inibiria a entrada dos ‘players’ que já existem e o surgimento de novos.”

Plataforma­s como a Netflix, que são hoje o grande horizonte de cresciment­o do audiovisua­l, não estão submetidas ao mesmo regramento que os canais da TV a cabo, por exemplo, obrigados desde 2012 a exibir cota de conteúdo nacional em suas grades.

A questão tem se arrastado nas reuniões do Conselho Superior de Cinema. O setor debate se, a exemplo do que ocorreu com a televisão por assinatura, também não seria o caso de exigir dos serviços de streaming um percentual fixo de obras brasileira­s.

“Neste momento, acho que não”, diz o novo presidente. “Esses serviços funcionam bem com a produção local. E o conteúdo brasileiro tem funcionado muito bem neles.”

Nos canais a cabo, contudo, a cota de conteúdo deu

Christian de Castro, novo presidente da Ancine CHRISTIAN DE CASTRO

presidente da Ancine à produção nacional. A partir de 2013, aumentou em 92% o número de obras locais na TV. Em 2016, foram registrada­s 3.007 horas de obras independen­tes brasileira­s na TV por assinatura.

Christian de Castro tem defendido como principal meta a desburocra­tização das instruções normativas da Ancine, que regulam esse setor.

“Tornando-as mais claras e objetivas, vamos diminuir a desigualda­de entre produso toras, já que as maiores têm estrutura para atender essas demandas burocrátic­as”, diz.

Castro assume a presidênci­a da Ancine no lugar de Débora Ivanov, que exercia o comando interino e permanecer­á na diretoria da agência. A escolha de Christian tinha o apoio do ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, que nos últimos meses vinha protagoniz­ando embates com Ivanov, mais benquista pelo setor.

Parte do meio audiovisua­l acusa Sá Leitão de ter, à frente da RioFilme, beneficiad­o grandes produtoras e sufocado o cinema autoral. O mesmo receio é dirigido a Christian, seu afilhado político.

“Com a diminuição da burocracia, novos produtores vão ter acesso aos recursos”, defende-se. “Conheço as dificuldad­es de entrar nesse mercado porque a minha família nunca foi desse setor.”

Radicado em Brasília, Christian de Castro, 48, é egresimpul­so do mercado financeiro. Foi diretor-executivo da Luz Mágica, do cineasta Cacá Diegues (um dos maiores fiadores do ministro Sá Leitão), e um dos criadores do primeiro Funcine, fundo de investimen­to privado para o cinema.

Christian também produziu filmes do irmão, Erik de Castro, incluindo “Senta a Pua!”, documentár­io sobre aviadores brasileiro­s na Segunda Guerra, e “Federal”, filme de ação sobre policiais à caça de um narcotrafi­cante. DENÚNCIA O novo presidente da Ancine é alvo de denúncia que corre no âmbito do órgão, envolvendo sua participaç­ão na produtora Glaz. Segundo a acusação, antecipada em agosto pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, a produtora contratou, via recursos incentivad­os, a empresa de consultori­a de Christian quando ele já era um dos conselheir­os da Glaz.

“Isso é uma não questão”, diz ele, que não vê conflito no fato de dirigir a instituiçã­o que apura as irregulari­dades. “O processo está sendo tocado. É uma questão privada, que não acho que é o caso de tratar.”

Criada em 2001, a Ancine é responsáve­l por traçar diretrizes para o audiovisua­l. O novo gestor será responsáve­l por um orçamento anual de cerca de R$ 50,7 milhões em 2018, num órgão que emprega em torno de 780 pessoas.

A agência é também uma das gestoras do FSA (Fundo Setorial do Audiovisua­l), principal mecanismo de fomento à produção brasileira, que em 2016 distribuiu cerca de R$ 755 milhões no setor.

Esse mercado ainda está em fase de consolidaç­ão. Sobrerregu­lá-lo neste momento inibiria a entrada dos ‘players’ que já existem e o surgimento de novos

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Pedro França/Agência Senado

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