Folha de S.Paulo

A insustentá­vel leveza de ser do PT

- GAUDÊNCIO TORQUATO

O ano eleitoral que se inicia coloca em xeque o dilema que tem afligido o PT ao longo dos últimos anos: arrefecer o peso do discurso, produzindo nova “carta aos brasileiro­s”, à semelhança da que Luiz Inácio Lula da Silva apresentou em 2002, ou continuar a massificar o bordão da luta de classes (“nós e eles”), sob a crença do eterno retorno, conhecido conceito de Nietzsche (18441900), ancorado no princípio de que as situações existencia­is se repetem indefinida­mente no tempo.

A dúvida que paira sobre o PT e seu chefe maior parece levar em conta, de um lado, a perspectiv­a de melhoria da economia —nesse caso, o discurso radical seria mal recebido por parcela da população— e, de outro, o resgate do legado que a administra­ção lulista se gaba de ter proporcion­ado ao país: a maior distribuiç­ão de renda da história. E que hoje virou fumaça.

A isca com que Lula pretende fisgar o eleitorado, em outubro, seria um elenco de compromiss­os com o povo, não apenas uma expressão moderada para cooptar o mercado, como se fez em 2002.

O fato é que o petismo está ajustando o discurso de forma a driblar os índices positivos alcançados pelo atual governo, rebater o tiroteio sobre a era petista, com foco no envolvimen­to de seus protagonis­tas no mensalão e na operação Lava Jato, e se apresentar como a melhor alternativ­a para enfrentar a crise (por ele perpetrada).

A identidade do petismo, plasmada ao longo do percurso iniciado em 1980, sempre se pautou pelo viés socializan­te. Recuperar o eixo histórico ante um Estado que avança na direção de reformas liberais e diminui seu porte não será fácil.

Lula abriu o discurso de posse na Presidênci­a, em 1º de janeiro de 2003, com o verbo mudar. Era o conceito que unia sindicalis­tas, intelectua­is e membros da Igreja Católica, fundadores do PT. Mas o país não mudou sob o mando petista. A leitura atual não perdoa os desvios do ciclo Lula/ Dilma, mesmo sob as glórias do programa distributi­vista de renda, assentado no Bolsa Família.

O ex-metalúrgic­o chegou a se autodesign­ar “metamorfos­e ambulante”, em peroração humorístic­a para explicar o vaivém do PT, ora trafegando na extrema esquerda do arco ideológico —quando grita jargões e ecoa o apartheid social—, ora aliado a siglas que o petismo condena, como o próprio MDB.

Imerso no arquipélag­o partidá- rio, o PT perdeu o discurso original, sujou-se no lamaçal da corrupção e, incrível, adentrará o campo eleitoral com alianças à direita e à esquerda, maneira de garantir a eleição do maior número de governador­es, senadores e deputados.

Lula deu o tom: o PT tem de ser pragmático. Precisa ganhar musculatur­a e garantir boa posição no ranking. A dúvida persiste: um discurso mais leve, menos radical, fará o gosto da militância? A resposta é não. O petismo tem a militância mais engajada e conta com a CUT e o MST, seus exércitos de retaguarda. Os militantes defendem um discurso virulento para compor a feição oposicioni­sta.

Para voltar a ser competitiv­o, ao PT sobra a alternativ­a de voltar a esgrimir a espada com que ataca o statu quo. Ocorre que o resgate da velha identidade só terá êxito caso as reformas do governo Temer derem com os burros n’água.

Só assim o petismo assumirá a condição de maior força oposicioni­sta. Em suma, não se sustenta a leveza de ser do PT. É mais provável que Lula assuma a cara zangada de João Ferrador, dos tempos de metalúrgic­o, para mostrar raiva e indignação como perseguido do juiz Sergio Moro. Pretende ir às urnas como vítima.

Condenado pelo TRF-4 e impedido de disputar o pleito, teria como modelo a figura do Nazareno carregando a cruz até o calvário. Sob o manto de mártir, há quem veja Lula puxando o substituto na direção do segundo turno da eleição. GAUDÊNCIO TORQUATO,

As candidatur­as presidenci­ais de Ciro Gomes em 1998 e 2002 naufragara­m precocemen­te por conta de seu destempero verbal em declaraçõe­s à imprensa. Na entrevista de Bolsonaro à Folha, fica patente que sua falta de controle, sua intemperan­ça no trato com a imprensa, comparada à do político cearense, pode ser elevada ao cubo.

LUÍS ROBERTO NUNES FERREIRA

Privatizaç­ão Antes de propor a privatizaç­ão de todas estatais por R$ 500 bilhões, o que apenas alimentari­a o bolso dos corruptos no poder, e também como se não houvesse corrupção no setor privado, a Folha poderia nos mostrar como os países ricos se desenvolve­ram. Por que todos se utilizaram de empresas estatais ou protegeram a indústria nacional para chegar aonde chegaram. O neoliberal­ismo não desenvolve­u país algum (“Privatizaç­ão de 168 estatais poderia render até R$ 500 bi”, “Mercado”, 14/1).

CRISTIANO PENHA

Sem as reformas, principalm­ente a da previdênci­a, as receitas de privatizaç­ões só servirão pra postergar problemas estruturai­s, que voltarão mais tarde, e aí não haverão mais empresas a privatizar e o problema das contas públicas virá com força muito maior.

OTÁVIO DE QUEIROZ

Acidentes em rodovias

Triste ver o esperneio de William Waack, tentando justificar (talvez para si mesmo) seu ato racista como uma simples piada. Num texto prolixo, visando exaltar suas próprias virtudes e agradecer àqueles que o apoiaram, esqueceu-se de tratar do ato. Waack claramente está mais preocupado consigo mesmo do que com aqueles que sofrem racismo diariament­e.

MAURICIO MORAIS TONIN,

Foi gratifican­te ler o artigo do William Waack. Finalmente foi permitido àquele jornalista apresentar sua versão sobre o nebuloso e estranho episódio, que motivou seu linchament­o público e consequent­e banimento da mídia brasileira. Parabéns à Folha pela coragem e integridad­e moral ao oferecer ao jornalista uma tribuna imparcial e confiável para manifestar-se.

LUIZ ANTÔNIO ALVES DE SOUZA

Colunistas

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