Moralidade, ainda que na marra
A nomeação para ministra do Trabalho de alguém com questões trabalhistas deve ser analisada pelo Judiciário, pois o Executivo não está nem aí
A suspensão da posse da quase ministra do Trabalho levanta a questão de saber até onde pode ir o Judiciário no controle de moralidade. Os juristas mais ortodoxos —e são muitos— demonstram certo desconforto: a questão nem deveria ser jurídica, disse nesta Folha a professora Eloísa Machado de Almeida.
Para ela, o Judiciário vem impondo uma agenda de moralização judicial da política, “muitas vezes à revelia do que diz a lei”.
Ela entende que “nada autoriza que o Judiciário atue fora das regras por aí, cassando mandatos ou nomeações”. E conclui: não há saída fora da Constituição.
Realmente, a saída está na Constituição, e também nas regras editadas para dar aplicação a seu artigo 37, cuja grande novidade foi a consagração do princípio de moralidade. É dever do magistrado, dentro dos limites da interpretação, buscar a solução que melhor atenda aos princípios constitucionais. O que não se admite é decisão puramente ideológica, apartada de normas e valores.
Para conter os excessos do Executivo, a doutrina francesa desenvolveu as ideias de desvio e de excesso de poder, mesmo em matérias em que o governante pode decidir livremente.
Caso típico de abuso foi a desapropriação da mansão de um banqueiro pelo governador da Bahia, como forma de retaliação pela venda do banco, com a alegação de ali instalar uma escola-parque destinada a excepcionais.
Embora a livre escolha de ministros seja atribuição do presidente da República, há uma regra basilar, que vale em qualquer tipo de empresa ou organização, salvo as criminosas: o agente público, funcionário, ou servidor, para ser admitido, deve ser uma pessoa idônea. Sem isso, é muito difícil conseguir emprego em qualquer lugar.
O servidor público não pode jamais desprezar o elemento ético de sua conduta, decidindo principalmente entre o honesto e o desonesto, determina o Código de Ética da Administração Pública Federal (decreto nº 1.171/94), que manda levar em conta “os fatos e atos verificados na conduta do dia a dia da sua vida privada”.
Já o Código de Conduta das Autoridades, em vigor desde 2000, afirma em sua exposição de motivos que a tarefa deve ter início pelo nível mais alto da administração — ministros de Estado, secretáriosexecutivos, diretores de empresas estatais e de órgãos reguladores—, que detém poder decisório: “Uma vez assegurado o cumprimento do Código de Conduta pelo primeiro escalão do governo, o trabalho de difusão das novas regras nas demais esferas da administração por certo ficará facilitado.”
As regras e os princípios são claros e incontornáveis, mas o que importa “é o nível de aplicação e acatamento das normas”, diz a ministra Cármen Lúcia, presidente do STF. E a Suprema Corte já tomou posição: “O princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do poder público que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos agentes e órgãos governamentais.”
O controle, portanto, nada tem de extravagante. A análise da moralidade de nomear para o ministério do Trabalho quem tem problemas com a lei trabalhista, ou para diretor do Detran quem teve a carta de habilitação suspensa por desrespeito às regras de trânsito, ou para qualquer posto quem já foi condenado pela Justiça, precisa mesmo ser examinada pelo Judiciário, pois o Executivo, aparentemente, não está nem aí. EDUARDO MUYLAERT,
As tragédias nas estradas federais de Minas Gerais são uma constante no estado. Curvas sinuosas agravadas por pistas escorregadias em dia de chuva e ultrapassagens irresponsáveis em alta velocidade, em locais proibidos. Já perdi parentes em desastres. Quase nada muda nestas estradas depois de décadas. Troca-se a Constituição de 1946 pela Constituição de 1988. Troca-se o regime militar pelo democrático. As pessoas continuam morrendo em acidentes previsíveis por causa de pista simples (“Acidente deixa 13 mortos e dezenas de feridos em estrada em MG”, “Cotidiano”, 13/1).
LUIZ ROBERTO DA COSTA JR.
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“Pessoas com uso problemático de drogas precisam ser tratadas como pacientes e não como criminosos” constitui uma das principais recomendações do Relatório da Comissão Global sobre Drogas, que conta com a colaboração de Fernando Henrique Cardoso, e que precisa ser lido pelo governador Geraldo Alckmim e pelo prefeito João Doria. É a conclusão que tiro do excelente artigo de Clóvis Rossi, hoje, na Folha (“Um outro olhar sobre drogas”, “Mundo”, 14/1).
EDUARDO MATARAZZO SUPLICY,
Parabéns, Rodrigo Zeidan. Sua primeira coluna na Folha nos tira do mais do mesmo. Concordo. O Brasil só tem dois problemas principais: violência e mobilidade social. Eu apenas trocaria a ordem: mobilidade social e violência, pois acredito que se houvesse uma melhor distribuição de renda, a violência diminuiria automaticamente (“Mobilidade social e desenvolvimento”, “Mercado”, 13/1).
JOSÉ DIEGUEZ