Folha de S.Paulo

OPINIÃO Retomada de diálogo traz alívio aos coreanos

Jogos Olímpicos de Inverno oferecem uma janela de oportunida­de para diminuir a tensão na península Coreana

- HAK YOU KIM

FOLHA

Uma eventual guerra na península coreana não deixaria nenhum vencedor e suas consequênc­ias são inimagináv­eis para o mundo.

Os coreanos, após um turbulento período no início do século 20, que se seguiu aos 35 anos de invasão pelo Japão, se viram mergulhado­s em uma guerra civil que ceifou mais de um milhão de vidas, entre 1950 e 1953, e testemunha­ram a divisão do seu território —depois de 5.000 anos de história na península Coreana.

Em que pese toda essa herança de dor e perdas, a determinaç­ão do povo coreano transformo­u um país que, em 1945, ao ser libertado do domínio japonês, tinha renda per capita inferior a US$ 65 e dois terços da população analfabeta, em uma nação industrial­izada e produtora de tecnologia de ponta, hoje com renda per capita de US$ 27 mil e dois terços dos jovens do ensino médio ingressand­o no ensino superior.

Ademais, a Coreia do Sul também tem demonstrad­o possuir uma democracia madura. Em 2017, a presidente Park Geun-hye sofreu impeachmen­t por acusações de abuso de poder e corrupção, tendo sido presa no dia 31 de março de 2017 por determinaç­ão da justiça coreana. Nas eleições antecipada­s, o presidente Moon Jae-in foi eleito e assumiu imediatame­nte.

As instituiçõ­es coreanas foram capazes de funcionar adequadame­nte e a justiça respondeu às exigências fundamenta­is de investigaç­ão e punição da corrupção sem que houvesse abalos na vida democrátic­a ou econômica.

Nos últimos anos, os coreanos têm vivido cotidianam­ente um clima de inseguranç­a, tendo em vista as provocaçõe­s do regime norte-coreano e a escalada retórica dos principais atores envolvidos no conflito da região.

Sendo assim, iniciativa­s para diminuir a tensão na península coreana e para enfrentar o avanço nuclear da Coreia do Norte são positivas. Assim deve ser entendida a reunião de alto nível, realizada no dia 9 de janeiro na Vila Panmunjom, na zona des- militariza­da entre os dois países. Foi o primeiro contato bilateral após um longo intervalo de dois anos e um mês.

As duas Coreias anunciaram conjuntame­nte, após 11 horas de reunião, que o Norte participar­ia dos Jogos Olímpicos de Inverno na cidade de Pyongchang, no Sul, e que os dois países iniciariam diálogo entre autoridade­s militares e negociaçõe­s visando discutir assuntos relacionad­os à península Coreana.

Há a sugestão de que os dois países façam juntos uma apresentaç­ão cultural na abertura dos Jogos de Inverno para simbolizar o desejo de união e paz dos coreanos.

Em concreto, os dois países religaram a linha telefônica direta de seus escritório­s de comunicaçã­o em Panmunjom e a linha de comunicaçã­o militar na região do mar do Oeste da península, suspensas desde fevereiro de 2016. Essas linhas de comu- nicação representa­m um sistema de segurança preventivo, evitando que uma situação acidental possa evoluir para um conflito armado e para incidentes que aumentem um risco de guerra.

O reinício de um diálogo militar entre os dois países é um resultado importante e valioso para aliviar a tensão na península Coreana.

O presidente Moon Jae-in já havia anunciado em Berlim, no ano passado, sua intenção de realizar todos os esforços possíveis para soluções negociadas e diplomátic­as na península Coreana.

Entretanto, a disposição do governo sul-coreano para o diálogo foi prejudicad­a pelas constantes provocaçõe­s da Coreia do Norte e pelo aumento da tensão militar na região. O governo Moon deu apoio incondicio­nal e participou ativamente de todas as medidas dos aliados e da comunidade internacio­nal pa- ra impor sanções ao Norte.

A importânci­a do diálogo e dos canais diplomátic­os nunca deixou de ser considerad­a, porém, sempre em acordo com as medidas para conter o avanço nuclear do Norte. Assim, o convite para que os norte-coreanos participem dos Jogos de Inverno constitui parte do esforço da Coreia do Sul de buscar canais de diálogo, facilitado pelo sinal emitido pelo discurso de AnoNovo do líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un.

Embora tímidos, tais esforços representa­m grande alívio para a sociedade coreana, que vislumbra nesta e em outras iniciativa­s e medidas a possibilid­ade de um acordo que leve à pacificaçã­o da região. O desejo dos coreanos por estabilida­de e paz, não obstante os imensos obstáculos, é o que move a política do presidente Moon. HAK YOU KIM

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