Folha de S.Paulo

ENTREVISTA Temos de agir na cidade antes que o mal aconteça

NOVO PRESIDENTE DO TCM PAULISTANO RESPONDE A CRÍTICA DO PREFEITO DE QUE TRIBUNAL ESTARIA PREJUDICAN­DO SÃO PAULO

- ROGÉRIO GENTILE

DE SÃO PAULO

O conselheir­o João Antonio da Silva Filho, 57, assumirá no dia 22 de janeiro a presidênci­a do Tribunal de Contas do Município, órgão responsáve­l pela fiscalizaç­ão das receitas e despesas da Prefeitura de São Paulo.

Na entrevista abaixo, responde às críticas feitas em dezembro pelo prefeito João Doria (PSDB). O tucano enfrentou, em seu primeiro ano de mandato, questionam­entos formais por parte do tribunal, que suspendeu editais e contrataçõ­es, bem como paralisou pontos importante­s do seu plano de desestatiz­ação.

Para Doria, “o TCM deveria atuar na fiscalizaç­ão das contas e da execução fiscal da prefeitura, e não em manifestaç­ões prévias”. O prefeito reclamou que os conselheir­os retardaram ações do seu governo e ”trouxeram prejuízo” à população.

João Antonio afirma que o tribunal não se pauta pelo calendário político eleitoral. “O tempo político do prefeito não está em sintonia com o da administra­ção”, afirma.

Diz também que é obrigação do TCM fazer o controle preventivo. “Temos de agir antes que o mal aconteça.”

Advogado e mestre em filosofia do direito, João Antonio foi secretário na gestão Fernando Haddad, vereador e deputado estadual pelo PT, partido do qual se afastou desde que foi indicado pela Câmara para o tribunal, em 2014. Segundo ele, o governo Haddad reclamava do TCM do mesmo jeito que Doria.

Sobre os 657 funcionári­os do órgão, número que inclui 175 indicados pelos cinco conselheir­os, diz que todos têm funções técnicas e que não há exageros no TCM. “A atuação do tribunal é eficaz.” Folha - O prefeito fez duras críticas ao TCM, dizendo que o tribunal exagera em suas funções e prejudica a cidade. O que senhor pensa disso?

João Antonio da Silva Filho - Atuamos com base em duas premissas: a legalidade do ato da administra­ção e o bom investimen­to do dinheiro público. Temos de agir sobre tudo que venha do prefeito e tenha alguma ameaça ao interesse público. Não podemos agir depois. Temos de agir preventiva­mente, antes que o mal aconteça. Qual a razão da insatisfaç­ão do prefeito?

O tempo político do prefeito não está em sintonia com o da administra­ção. Estabelece­r um tempo para suas metas políticas é direito subjetivo dele. O que não é razoável é querer que a ação do tribunal seja pautada pelo calendário político eleitoral. Ao assumir, ele tinha pressa em realizar alguns programas. Só que a dinâmica do poder público é outra. É preciso ter paciência, conversar com a Câmara, explicar tecnicamen­te para o tribunal de contas, discutir previament­e quando vai lançar um edital. Essas questões às vezes passam desaperceb­idas no Executivo. Há falta de compreensã­o sobre os limites da atuação do gestor público?

Doria traz uma cultura do mundo particular, onde o que não é proibido por lei é permitido fazer. No mundo público é diferente. O que impera é o princípio da legalidade estrita. Só pode fazer o que a lei autoriza. A vontade individual do titular do Executivo não impera. Precisa ser ponderada com a supremacia do interesse público. é a despesa anual com funcionári­os* é o orçamento do órgão previsto para 2018 (9% a menos do que em 2017) O TCM barrou vários pontos do plano de privatizaç­ão. A pressa política prejudicou a formatação dos projetos?

A crítica específica que o prefeito fez ao TCM na questão do programa de desestatiz­ação ocorreu em relação à SPTuris [companhia proprietár­ia do Anhembi]. Disse que o TCM atuou antes de o ato se concretiza­r, antes de a licitação ir para a rua. Mas são coisas diferentes. A administra­ção praticou um ato para viabilizar um estudo sobre o potencial econômico de mercado e de venda da empresa, com uma previsão de custo de R$ 11 milhões. O conselheir­o Domingos Dissei não atuou na licitação, mas em relação a esse ato. Não atuar seria prevaricar, já que a nossa auditoria apontou uma série de razões técnicas que levantavam dúvidas sobre o projeto. Não levava em conta, por exemplo, o tombamento em curso do Anhembi e a questão do zoneamento naquela região. Tudo isso pode ter um impacto no valor do imóvel. O que o TCM O TCM tem 657 funcionári­os, sendo que há mais comissiona­dos [175], indicados por conselheir­os, do que auditores [168]. Não é gente demais?

A imensa maioria é concursada. Em relação aos 175 de confiança, diferentem­ente do que ocorre em outras áreas, onde a razão é política, aqui todos têm função técnica. São advogados, engenheiro­s, economista­s, todos com uma atuação muito específica. Com hora para entrar e para sair. Não há nenhum exagero. Outra questão é o pagamento de auxílio-moradia. Dois conselheir­os recebem a verba mesmo tendo residência em São Paulo. O conselheir­o Maurício Faria disse à Folha que “os não corruptos precisam lixo nas ruas. Os consórcios contratado­s estavam pedindo cerca de R$ 358 milhões a mais, a título de reequilíbr­io econômico-financeiro. Nossa auditoria, porém, apontou que, em vez de receber a mais, deveriam devolver para o Tesouro R$ 670 milhões em razão de contrapart­idas que deixaram de realizar. A atuação do tribunal é eficaz.

O tempo político do prefeito [João Doria (PSDB)] não está em sintonia com o da administra­ção. Estabelece­r um tempo para suas metas políticas é direito subjetivo dele. O que não é razoável é querer que a ação do tribunal seja pautada pelo calendário político eleitoral

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