Folha de S.Paulo

Não acho que ser vítima seja um insulto. Nós não estamos

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Folha - Catherine Deneuve e outras mulheres publicaram um artigo na última semana dizendo que o movimento #MeToo é influencia­do por puritanism­o. Isso surpreende?

Caroline de Haas - Não me surpreende­u. Toda as vezes em que os direitos das mulheres progredira­m vimos esse tipo de reação, como o artigo de Catherine Deneuve. Mas me entristece­u —como quando estamos com a nossa família ou com nossos amigos e eles falam alguma idiotice sobre a igualdade de gênero.

É sempre o mesmo argumento, o que não é original. São estereótip­os, e não a realidade. Por exemplo, quando dizem que há ódio contra os homens, o que não é verdade.

A carta me entristece­u também porque envia uma mensagem clara às mulheres que são vítimas da violência: calem-se. Isso é algo perigoso. Nós precisamos (na França, no Brasil e em todo o mundo) que as pessoas ouçam os gritos das mulheres e essas celebridad­es [francesas] estão usando a sua fama para dizer que as mulheres se calem… A senhora diz que há sempre esse tipo de reação. Por quê?

Porque a igualdade de gênero não é uma pequena mudança. É uma revolução. É algo bastante grande. Se nós tivermos sucesso, vamos mudar toda a sociedade: o trabalho, as relações, a política, a imprensa. Quando um grupo diz que quer fazer uma revolução, há sempre quem diz “meu Deus, isso é muito agressivo. É demasiado, vá devagar”. Críticos como Deneuve e Catherine Millet sugerem que os homens têm o direito de flertar livremente com mulheres e que a campanha do #MeToo está indo longe demais. Concorda? so duas coisas que são muito diferentes: a sedução e a violência. Uma relação normal entre um homem e uma mulher é baseada em igualdade e em respeito. A violência não é um “flerte plus plus”. Não é um “flerte maior”. É outra coisa.

É uma relação baseada em desigualda­de e dominação. É perigoso misturarmo­s ambas as coisas porque, quando você faz isso, diz que a violência não é tão ruim. Que não é grave.

Eles estão errados quando dizem que essa campanha afeta a liberdade sexual.

A violência contra as mulheres impossibil­ita que exista uma sociedade em que elas sejam livres. Parte da crítica ao #MeToo é a de que o movimento retrata as mulheres como indefesas, ao descrevê-las repetidame­nte como vítimas.

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