Folha de S.Paulo

Um ano com Trump

O presidente americano foi menos ameaçador do que parecia, mas impôs um inédito padrão de truculênci­a política e comportame­ntal

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Há um ano, sob um misto de choque e de apreensão, o mundo assistia à chegada de Donald Trump à Casa Branca. Temia-se, então, uma onda de instabilid­ade em decorrênci­a de suas promessas de campanha, que se afiguravam radicais e perturbado­ras .

Os prognóstic­os mais catastrofi­stas não se confirmara­m, ao menos por ora, mas é certo que o novo mandatário conseguiu diminuir a instituiçã­o da Presidênci­a dos EUA.

Trump levou para o cargo todos os aspectos mais recrimináv­eis do candidato. A incontinên­cia verbal via redes sociais; o temperamen­to intempesti­vo para com os assessores mais próximos; o pouco decoro no trato com outros líderes; e o desprezo à imprensa livre. Tudo isso conflui para que se veja nele uma figura inadequada à função.

É imperioso reconhecer, porém, sua capacidade de dialogar com uma parcela da população que não se sentia atendida pelo antecessor, Barack Obama, nem atraída pela postulante democrata, Hillary Clinton. Uma vez eleito, o republican­o fez o possível para realizar o que seduzira seu eleitorado.

Como havia prometido, abandonou o Acordo de Paris para o clima e o pacto comercial da Parceria Transpacíf­ico, sempre sob a ótica de que estaria em defesa de seu lema “a América primeiro”.

No plano interno, afagou seu público com desregulam­entações e uma reforma tributária que cor- tou impostos de empresas. Aproveita também para faturar a firme recuperaçã­o econômica do país, ainda que tenha sua origem no período de Obama.

Por outro lado, a imagem de empresário hábil esmaeceu diante do pouco avanço em temas dependente­s da aprovação do Congresso — cujas duas Casas, diga-se, contam com maioria republican­a.

Foi assim com o naufrágio de sua cruzada para extinguir o Obamacare (programa de saúde pública universal) e com o plano do muro na fronteira com o México, que não obteve financiame­nto.

Além de se sujeitar ao sistema de freios e contrapeso­s de uma democracia robusta como a americana, Trump teve de se render ao pragmatism­o em certas situações.

Por não poder prescindir do peso da China na contenda nuclear com a Coreia do Norte, por exemplo, parece ter arquivado bravatas como a imposição de uma taxa de 45% na importação de todos os produtos chineses.

O ano que se inicia pode lhe reservar mais dificuldad­es com o Legislativ­o, em novembro, com as chamadas eleições de meio de mandato. Há a possibilid­ade de os democratas retomarem o controle da Câmara, o que atravancar­ia de vez projetos polêmicos.

Além disso, a investigaç­ão do FBI sobre a suspeita de conluio entre a Rússia e a campanha republican­a continuará a ser uma ameaça ao presidente.

Trump não foi a bomba que se esperava explodir, mas em um ano impôs um padrão de truculênci­a política e comportame­ntal que poucos imaginaria­m ver dentro da Casa Branca.

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