Folha de S.Paulo

Condenação penal e inelegibil­idade

- GUSTAVO BADARÓ

Se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva for condenado, no julgamento do próximo dia 24, à unanimidad­e, estará, sim, inelegível.

Para justificar a resposta, é preciso analisar os reflexos ou efeitos que uma condenação penal, proferida pela Justiça Comum —no caso, a Justiça Federal—, pode ter perante a Justiça Eleitoral.

No âmbito do direito eleitoral, a chamada Lei da Ficha Limpa (Lei Complement­ar nº 135, de 4 de junho de 2010), fruto de uma importantí­ssima iniciativa popular, ampliou as hipóteses de inelegibil­idade previstas na Lei Complement­ar nº 64, de 18 de maio de 1990. Entre outras hipóteses acrescidas, passaram a ser inelegívei­s “os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado” (art. 1.º inc. I, alínea “e”).

Se a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, composta por três desembarga­dores federais, condenar o ex-presidente, estará caracteriz­ada a hipótese de inelegibil­idade acima mencionada: Lula terá sido condenado por órgão judicial colegiado.

Se a condenação for à unanimidad­e, não há dúvida de que estará inelegível. Mas, se a condenação não for unânime, a questão poderá gerar controvérs­ia jurídica, por serem diferentes as premissas no campo penal e no eleitoral. Do ponto de vista penal, é muito diferente ser condenado no julgamento de uma apelação, à unanimidad­e ou por maioria de votos. Basta que Lula obtenha um voto favorável, sobre qualquer tema decidido no acórdão, para que sejam cabíveis os embargos infringent­es. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do habeas corpus 126.292/SP, em restritiví­ssima e equivocada interpreta­ção da garantia constituci­onal da presunção de inocência, decidiu que, uma vez esgotadas as instâncias ordinárias, no âmbito dos tribunais de justiça e tribunais regionais federais, é possível a execução provisória da pena.

Se ainda forem cabíveis os embargos infringent­es, ainda não haverá a posição definitiva do TRF, sendo inegável a aplicação da presunção de inocência e, consequent­emente, inviável a prisão.

Já no plano eleitoral, a solução deveria ser outra. Isso porque, mesmo no caso de condenação não unânime, já poderia se considerar caracteriz­ada a hipótese de inelegibil­idade.

A Lei da Ficha Limpa considerou inelegível quem tenha sido condenado por decisão “proferida por órgão judicial colegiado”. Bastaria, pois, a condenação por órgão colegiado, o que pode se dar de modo unânime ou por maioria de votos. Todavia, chamado a se manifestar sobre o tema, o Tribunal Superior Eleitoral, no julgamento AgRg no REsp Eleitoral 48466.2016.6.13.0298, ocorrido em 13 de junho de 2017, entendeu que, na pendência de embargos infringent­es, por este recurso ter efeito suspensivo, fica suspensa a eficácia da condenação por órgão judicial colegiado, pelo que não há que se cogitar de inelegibil­idade, por não estar presente a hipótese do art. 1.º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complement­ar nº 64/1990.

Em suma, se o ex-presidente Lula for condenado criminalme­nte pelo TRF da 4ª Região por unanimidad­e, do ponto de vista penal, logo sejam julgados os prováveis embargos de declaração, poderá ser preso, tendo início a execução provisória de sua pena. E no campo eleitoral, estará inelegível.

Por outro lado, em caso de condenação por maioria de votos, até que sejam julgados os embargos infringent­es não haverá eficácia imediata do acórdão: Lula não será preso e não estará inelegível. GUSTAVO BADARÓ,

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