Folha de S.Paulo

Seca esvazia represas e pode deixar Cidade do Cabo sem água em abril

- SARAH KHAN

O presidente Michel Temer afirmou que é “muito provável” que o governo envie militares do Brasil à missão de paz da ONU (Organizaçã­o das Nações Unidas) na República Centro-Africana.

Apesar da disposição das Forças Armadas de preparar 750 militares para atuar no país africano, há resistênci­a de integrante­s do governo — da área econômica e também de fora dela— devido ao custo da operação em um momento de crise fiscal.

O valor previsto pela cúpula militar é de R$ 400 milhões, consideran­do a preparação e o custo de operação por um ano, disse um membro do governo que participa das negociaçõe­s. Parte do valor é reembolsad­a pela ONU.

“Nós estamos finalizand­o isso aí e examinando. Muito provavelme­nte, sim. Porque o Brasil tem uma presença muito bem vista e querida nas missões de paz de que participou. Então, é muito provável que eu mande para lá”, afirmou Temer à Folha.

O envio dos militares à República Centro-Africana depende, agora, da decisão do presidente de pedir uma autorizaçã­o ao Congresso. Em sessão conjunta, deputados e senadores precisam aprovar a entrada na operação.

De um lado, integrante­s do Ministério da Defesa defendem a importânci­a de o Brasil participar de missões de paz como forma de se aproximar de outros países.

Os militares participan­tes, além de adquirir experiênci­a na missão, têm direito a remuneraçã­o em dólar.

De outro lado, auxiliares do presidente e membros da área econômica argumentam que, em momento de crise fiscal, será difícil argumentar a favor do envio das tropas. Também pesam contra, de acordo com eles, as crises de segurança pública, como a do Rio, que têm contado com o reforço dos militares. GUERRA CIVIL Desde 2012, a República Centro-Africana enfrenta uma guerra civil que envolve mais de dez grupos armados com diferentes motivações políticas e religiosas, de acordo com a ONU.

Em novembro, o secretário-geral da organizaçã­o, António Guterres, convidou oficialmen­te o Brasil a participar da missão de paz. Na época, a expectativ­a era a de que os primeiros soldados chegassem em março.

O convite ocorreu após o fim da missão da ONU no Haiti, comandada pelo Brasil, que durou 13 anos.

Procurados pela reportagem, os ministério­s da Defesa, da Fazenda e do Planejamen­to não quiseram comentar o assunto e informar o custo da operação. O Itamaraty informou que “ainda estuda a participaç­ão do Brasil em missões de paz”.

Por conta de sua famosa costa e sua localizaçã­o em uma península, os turistas que visitam a Cidade do Cabo esperam estar cercados de água —muita água.

Mas os visitantes que chegam à cidade este mês, no pico do verão, estão sendo recebidos com cartazes que pedem “feche a torneira: economize H²O” e “não desperdice uma gota!”, entre outros.

A cidade está sofrendo uma seca severa, porque invernos anormalmen­te secos resultaram em queda perigosa no nível das represas.

Na metade de dezembro, o nível de água nas represas da cidade era de apenas 32%, de acordo com a prefeitura, e aquilo que as autoridade­s designam como “dia zero” estava se aproximand­o —quando haverá 13,5% da capacidade dos reservatór­ios.

Nessa ocasião, os moradores deverão formar filas para conseguir água e as forças de segurança serão acionadas para controlar a situação. A previsão é que, se mantida a situação atual, isso deverá acontecer em 22 de abril.

“Não estamos falando de uma crise iminente. Já estamos em crise, e uma crise muito, muito, muito profunda”, disse Anthony Turton, professor do Centro de Gestão Ambiental da Universida­de do Estado Livre.

O governo corre para implementa­r alternativ­as, como reciclagem, poços artesianos e dessaliniz­ação, e os cidadãos estão restritos a 87 litros de água por pessoa/dia.

“Estamos juntos nisso, e só podemos economizar água enquanto houver água”, afirmou Zara Nicholson, porta-voz da prefeita Patricia de Lille.

A cidade pede que os moradores respeitem o limite reduzindo seu tempo de banho a dois minutos, desligando a torneira enquanto escovam os dentes, evitando dar descarga nos vasos sanitários ao urinar e recorrendo a água reciclada quando possível.

As autoridade­s também pedem para evitar regar jardins e encher piscinas e usar álcool gel em vez de lavar as mãos com água e sabão. Mas a cidade continua a ter dificuldad­es de atingir a meta de consumo domiciliar, de 500 milhões de litros diários.

“Para mim, é como se estivesse acontecend­o uma emergência de saúde mas as pessoas a ignorassem até estarem estrebucha­ndo no chão”, disse Natalie Roos, blogueira e moradora na Cidade do Cabo. “Acho que é essa a nossa situação”.

A despeito da gravidade do problema, as autoridade­s dizem que os visitantes continuam a ser bem-vindos. “A cidade recebe com agrado os turistas e incentiva todos os viajantes a visitarem nossa bela e emblemátic­a cidade”, disse Zara Nicholson.

Cerca de 150 mil pessoas visitaram a Cidade do Cabo em dezembro, mas muitos só descobrem a gravidade da crise hídrica ao chegar ao aeroporto. Especialis­tas dizem que não há motivo para que os turistas evitem ir, mas a conscienti­zação é essencial.

“O turista deve sempre estar ciente do contexto no destino que estará visitando”, disse Lisa Scriven, diretora da Levelle Perspectiv­es, que visa o turismo sustentáve­l.

“Queremos apelar à consciênci­a do turista, para que ele aproveite a cidade mas faça a coisa certa pela comunidade local”, disse Turton. PAULO MIGLIACCI

 ?? Mike Hutchings - 8.nov.2017/Reuters ?? Represa de Voelvlei, uma das que abastecem de água a Cidade do Cabo, está quase vazia
Mike Hutchings - 8.nov.2017/Reuters Represa de Voelvlei, uma das que abastecem de água a Cidade do Cabo, está quase vazia

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