Folha de S.Paulo

A quem interessa ajudar o Aedes aegypti?

A tecnologia desenvolvi­da pela empresa Oxitec levou a reduções anuais de 80% na presença do mosquito em áreas de Piracicaba

- JORGE A. ESPANHA

O mosquito Aedes aegypti causa hoje danos gigantesco­s ao Brasil. Leitores deste jornal são servidos, quase que diariament­e, de farta informação sobre esse vetor de doenças, capaz de infectar 2 milhões de pessoas por ano e de levar a perdas econômicas de R$ 2,3 bilhões anuais no país, além de impor sofrimento humano imensuráve­l.

A luta contra esse danoso inseto —transmisso­r de zika, dengue, chikunguny­a e também da febre amarela urbana— tem ocorrido em muitas frentes, sendo uma delas a implementa­ção de tecnologia­s inovadoras no controle do vetor.

Nesse setor, destaca-se uma iniciativa da Oxitec: o mosquito geneticame­nte modificado desenvolvi­do pela empresa na Universida­de de Oxford, na Inglaterra, que tem obtido resultados sem precedente­s na supressão da população selvagem do Aedes aegypti.

Presente há quase três anos em Piracicaba (SP), a tecnologia tem levado a reduções anuais da ordem de 80% na presença do mosquito selvagem nas áreas em que é usada.

Esse resultado, do qual nenhuma outra estratégia semelhante se aproxima, é atestado por técnica de monitorame­nto recomendad­a pela OMS (Organizaçã­o Mundial da Saúde), com números que são públicos.

Desde abril de 2014, a CTNBio — órgão federal responsáve­l pela avaliação de organismos geneticame­nte modificado­s no país— considera seguro o uso comercial da tecnologia. Prefeitos de várias cidades brasileira­s já procuram a Oxitec para adoção do “Aedes do Bem”.

Em Juiz de Fora (MG), o mosquito é utilizado para combater o Aedes aegypti desde novembro de 2017. Países como os EUA também demonstram interesse na tecnologia.

Gestores públicos sabem que estratégia­s corretas de combate a doenças infecciosa­s trazem benefícios sociais e econômicos. Custos diretos e indiretos de zika, dengue e chikunguny­a subtraíram, no mínimo, R$ 800 milhões da economia do Brasil em 2016.

E como mensurar o sofrimento das mais de 2.000 crianças vítimas de problemas neurológic­os provocados por zika?

O poder público há muito se dedica a combater o criadouro do mosquito. Infelizmen­te, essa importante medida, quando associada a métodos tradiciona­is de controle de vetor, não tem conseguido frear o cresciment­o das epidemias.

Na década de 1990, o Brasil registrou 1,5 milhão de casos de arbovirose­s. Na década inacabada de 2010, eles já somam mais de 7 milhões.

A expansão de uma tecnologia inovadora para controle de vetores é, então, não apenas desejável como inevitável. O surgimento de mosquitos resistente­s a inseticida­s químicos é um problema que desponta no horizonte da saúde pública.

A quem interessa prejudicar o trabalho pioneiro da Oxitec em Piracicaba, município com política modelo de combate ao Aedes aegypti?

Na última segunda-feira (5), jornalista da Folha fez uso de fonte anônima com argumentos técnicos equivocado­s para apontar supostas falhas no trabalho da empresa no município. O jornal publicou fato inverídico por ter sido induzido ao erro. Temos confiança de que vai reavaliar o texto em questão.

O Brasil tem hoje chance única de mostrar ao mundo como ser pioneiro na redução efetiva do mosquito Aedes aegypti.

Num mundo em transforma­ção, onde tecnologia­s de ruptura como inteligênc­ia artificial e carros autônomos apontam para grandes mudanças econômicas e sociocultu­rais, veículos de comunicaçã­o como esta Folha têm papel fundamenta­l em desafiar também o atraso na adoção de políticas de saúde pública inovadoras. JORGE A. ESPANHA

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil