Folha de S.Paulo

Subsídios de Doria a ônibus superam obras

Prefeito repassou às empresas R$ 2,9 bi para cobrir gastos do transporte, R$ 1 bi a mais que todos os investimen­tos de SP

- ROGÉRIO GENTILE Tarifas

‘Não hav ia o utra saída’, afirma secretário do tucano; gestão prevê desembolsa­r mais com obras ao longo de 2018

Em seu primeiro ano de mandato, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), gastou mais recursos públicos com o subsídio à tarifa de ônibus do que com todas as obras municipais somadas.

O prefeito repassou R$ 2,9 bilhões para as empresas que fazem o transporte coletivo a fim de cobrir a diferença entre o que é arrecadado com as passagens e a remuneraçã­o prevista em contratos.

Já os chamados investimen­tos, verba destinada ao pagamento de obras e para a compra de equipament­os, consumiram apenas R$ 1,9 bilhão, um dos valores mais baixos da história recente.

Em 2014, para comparação, foram R$ 4,4 bilhões (valor corrigido pela inflação).

O gasto com subsídio é uma via de mão dupla. A redução do valor significar­ia um aumento da tarifa ou a redução das chamadas gratuidade­s (isenções para estudantes de escola pública e idosos, por exemplo).

Segundo cálculos do setor, se a prefeitura não gastasse nada com subsídios, a tarifa que hoje custa R$ 4 passaria a ser próxima de R$ 6,50.

Por outro lado, como o dinheiro é limitado, para bancar o subsídio, a prefeitura deixa de investir em determinad­as obras ou setores nos quais há alguma demanda.

No ano passado, Doria teve de transferir cerca de R$ 1 bilhão em investimen­tos previstos no Orçamento para completar o valor pago às viações. Retirou, por exemplo, R$ 106 milhões de um projeto de implantaçã­o e requalific­ação dos terminais e outros R$ 100 milhões de obras de recuperaçã­o e construção de novos corredores de ônibus.

O prefeito deixou também de aplicar R$ 77,5 milhões na urbanizaçã­o de favelas e R$ 50 milhões na construção de unidades habitacion­ais.

“Ou se pagava o subsídio, mantendo a tarifa mais baixa, ou se faziam essas obras”, afirma o secretário da Fazenda de Doria, Caio Megale. “Como a receita não cresceu, não havia outra saída.”

Em 2018, a cidade prevê gastar R$ 3 bilhões em subsídio e mais R$ 300 milhões em valores atrasados, que deveriam ter sido transferid­os para as empresas em 2016. O investimen­to em obras, diz a gestão Doria, será maior, de cerca de R$ 5,9 bilhões.

Neste ano, Doria postula a vaga de candidato do PSDB ao governo de São Paulo —se for escolhido pelo partido, terá que deixar a prefeitura até o início de abril. PROTESTOS DE JUNHO O gasto com subsídio explodiu a partir dos protestos de junho de 2013. Acuados pelas manifestaç­ões, o então prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) revogaram o reajuste concedido para as passagens de ônibus, metrô e trens.

“Precisamos abrir a discussão sobre as consequênc­ias dessa decisão para hoje e para o futuro, porque conforme o governador disse, não há como fazê-lo sem ser às expensas do investimen­to”, afirmou Haddad na época.

Apesar do tom de preocupaçã­o, em 2014, ano de eleição presidenci­al, o prefeito reduziu de 65 para 60 anos o bilhete do idoso, intensific­ando o problema. E, em 2015, concedeu tarifa zero para estudantes de baixa renda. Com subsídio ao sistema de ônibus Engenharia de tráfego Educação de trânsito Implantaçã­o e melhoria de terminais Implantaçã­o e melhoria de corredores Urbanizaçã­o de favelas Modernizaç­ão de semáforos Reforma de calçadas Preservaçã­o do patrimônio Outros RAIO-X DO SISTEMA DE ÔNIBUS De onde vem o dinheiro para cobrir os custos 62% Evolução dos subsídios, em R$ bilhões**

Com isso, o gasto com subsídio, que foi de R$ 1,3 bilhão em 2012, passou para R$ 2,6 bilhões em 2016, o último de Haddad à frente da cidade (valores corrigidos pela inflação para dezembro de 2017).

Doria manteve a política de Haddad e não elevou a tarifa dos ônibus no ano passado em razão de uma promessa que havia feito na campanha.

Em janeiro deste ano, subiu a passagem para R$ 4, mas, ainda assim, abaixo da inflação acumulada. DESPESAS A crise econômica dos últimos anos e a queda na arrecadaçã­o de impostos agravaram a realidade do cofre municipal. Além dos investimen­tos, as despesas de custeio também foram afetadas, o que ajuda a explicar o acúmulo de buracos nas ruas e avenidas, a grama alta nos parques e uma série de problemas nos serviços públicos da cidade.

“Com a crise, o aumento dos custos e do deficit da Previdênci­a, as finanças da cidade foram estrangula­das”, diz Megale. “Se nada estrutural for feito, o próximo prefeito terá muita dificuldad­e para governar”, afirma o secretário de Doria, que enviou à Câmara um projeto de reforma da Previdênci­a municipal.

Desde o anúncio do aumento da tarifas, pelo menos três protestos foram realizados em São Paulo pelo Movimento Passe Livre (MPL).

Francisco Bueno, portavoz do grupo, afirma que transporte público é uma questão social e que o poder público deve encontrar caminhos para financiá-lo.

“É possível taxar as fortunas, cobrar imposto dos helicópter­os e deixar de financiar obras como a ponte estaiada, voltadas para o transporte privado”, diz Bueno. Para ele, não há necessidad­e de tirar dinheiro do social.

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Passageira caminha no terminal Bandeira, no centro de São Paulo

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