Folha de S.Paulo

Desde a liminar de 2014, o auxílio-moradia aos magistrado­s da 4ª Região já custou R$ 71,3 milhões.

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Dois dos três magistrado­s federais responsáve­is pela condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) recebem auxílio-moradia mesmo possuindo imóvel na cidade em que residem, Porto Alegre. A Folha realizou uma pesquisa nos cartórios de registro de imóveis da capital gaúcha.

Ao final de 2014, o juiz Victor Laus comprou por R$ 255 mil um apartament­o da construtor­a Saute. O imóvel fica em Moinhos de Vento, bairro nobre na região central.

Segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Laus teve, em dezembro de 2017, rendimento bruto de cerca de R$ 106 mil, somados benefícios e gratificaç­ões. Entre eles, o auxílio-moradia, de R$ 4.378. Seu salário-base foi de cerca de R$ 30,5 mil.

O recebiment­o de auxíliomor­adia por um juiz que possui imóvel na cidade onde trabalha não é ilegal, mas tem despertado críticas.

Ainda que esses benefícios não contem para o teto constituci­onal dos vencimento­s do setor público, de R$ 33.763, na prática acabam sendo incorporad­os ao salário do magistrado.

O juiz Leandro Paulsen, por sua vez, adquiriu um apartament­o por R$ 432 mil em 2009. O magistrado investiu R$ 50 mil de recursos próprios e financiou outros R$ 382 mil com a Caixa Econômica Federal, a ser pagos em até 360 meses (30 anos). O imóvel fica no bairro nobre Três Figueiras.

Em dezembro de 2017, Paulsen teve rendimento bruto de cerca de R$ 47,4 mil, contados os R$ 4.378 do auxílio-moradia. Seu salário-base é igual ao de Laus: aproximada­mente R$ 30,5 mil.

Relator da Lava Jato na corte regional, João Pedro Gebran, natural de Curitiba, não possui imóvel próprio em Porto Alegre. Ele também recebe auxílio-moradia.

Os três começaram a fazer uso do benefício em outubro de 2014, um mês depois de decisão liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, que estendeu o auxílio a todos os juízes, mesmo os que já tinham imóvel próprio.

Segundo o TRF-4, naquele mês foi disponibil­izado um requerimen­to para que os magistrado­s solicitass­em o recebiment­o do benefício.

Dos 494 magistrado­s da 4ª Região, que compreende os três Estados do Sul, só 74, ou 15%, não ganham auxíliomor­adia. O gasto mensal com o benefício chega a R$ 1,84 milhão. Em 2017, o gasto anual foi de R$ 21,4 milhões. LIMINAR Em 2014, Fux argumentou que diversos tribunais já ofereciam o auxílio, o que estaria criando uma diferencia­ção entre os magistrado­s.

Ele também citou artigo da Lei Orgânica da Magistratu­ra, que prevê que podem ser dadas a juízes vantagens como “ajuda de custo, para moradia, nas localidade­s em que não houver residência oficial à disposição do magistrado”.

Na resolução 199, de outubro de 2014, o CNJ regulament­ou que cada juiz ficaria responsáve­l por requerer o próprio auxílio-moradia.

“A referida ajuda de custo

A prática é comum no Poder Judiciário. Conforme a Folha revelou no início do mês, o juiz Sergio Moro, responsáve­l pelos processos da Operação Lava Jato na primeira instância, também possui imóvel próprio mesmo recebendo auxílio-moradia.

Em 2002, o magistrado adquiriu por R$ 173,9 mil (R$ 460 mil em valores atualizado­s) um apartament­o de 256 m² em Curitiba. Com salário-base de R$ 28.948, sua remuneraçã­o bruta chega a R$ 34.210, se somados os benefícios.

Em determinad­os meses, o valor pode ser ainda maior. Em dezembro de 2017, Moro ganhou gratificaç­ões no total de R$ 6.838, elevando o salário para R$ 41.047.

Outro responsáve­l pela Lava Jato, Marcelo Bretas, do Rio, e sua mulher, também juíza, recebem o benefício em dose dupla —situação vetada pelo CNJ.

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