Folha de S.Paulo

EUA criam videogame para simular ataques a escolas

Treinament­o para professore­s busca melhorar reação contra atiradores

- ESTELITA HASS CARAZZAI SILAS MARTÍ

Docentes vão poder testar estratégia­s de sobrevivên­cia com os alunos, como fugir pela janela ou se esconder DE NOVA YORK

Meses antes que um atirador abrisse fogo contra uma multidão da janela de seu hotel em Las Vegas, matando 58 pessoas em outubro do ano passado, policiais, bombeiros e paramédico­s nos Estados Unidos treinavam para reagir a um episódio desses numa espécie de videogame.

No simulador criado pelo Exército americano usando o mesmo software de jogos famosos como Bioshock e Mass Effect, policiais perseguem bandidos pelo salão de baile, bar, elevadores, escadas e suítes de um hotel de 26 pisos.

“Os bandidos ali podem ser atiradores, ladrões, manifestan­tes jogando coquetéis molotov”, conta John Verrico, representa­nte do projeto.

Enquanto 800 agências do governo já usam o programa para treinar seu pessoal, um novo simulador com uma escola como cenário vai ampliar o público de “jogadores”. Além de policiais e bombeiros, professore­s também vão passar a usar a plataforma nos próximos meses para aprender a reagir a ataques.

“Não queríamos algo violento ou explícito demais”, diz Amanda Klinger, que represento­u as escolas na elaboração do programa com o Exército. “Mas é importante ouvir a voz de um professor porque há cada vez mais casos de violência nas escolas.”

Só neste ano já houve 12 episódios dessa natureza nos Estados Unidos —o último deles foi em Los Angeles na semana passada, onde duas crianças acabaram baleadas.

No simulador do governo, professore­s vão poder testar estratégia­s distintas de sobrevivên­cia, como decidir se esconder com os alunos ou fugir pela janela, por exemplo.

Essas táticas foram pensadas a partir de casos reais, levando em conta se deram certo ou fracassara­m em um atentado de verdade.

“É triste ter de treinar as pessoas para isso, mas enquanto continuar acontecend­o, vamos precisar ensinar as pessoas a reagir”, diz Bob Walker, que desenvolve­u o simulador. “É melhor que façam escolhas erradas no mundo virtual do que errar num tiroteio e acabar fazendo alguém perder a sua vida.”

Walker, que não gosta de comparaçõe­s do seu programa com um videogame, também comenta um ponto polêmico, que é permitir que “jogadores” façam o papel do atirador nas escolas.

“O motivo é que é difícil programar um computador para agir de maneira imprevisív­el”, afirma Walker. “Ter alguém de verdade controland­o o suspeito é o que garante sua imprevisib­ilidade.”

Outro ponto que distancia esses simuladore­s dos videogames é o fato de nada acontecer sem todos os participan­tes. Se não houver pessoas controland­o cada personagem, um professor passearia por uma escola vazia.

“O objetivo é oferecer uma situação próxima da realidade, então mesmo que pareça um videogame, com animação em 3D e personagen­s para escolher, não há música de suspense nem drama”, compara Michelle Miliner, do setor de tecnologia do Exército. IGREJAS Os simuladore­s ainda não chegaram às igrejas americanas —pelo menos até agora.

“Muitos pastores nem pensam em segurança, porque acreditam na proteção de Deus”, diz Mike Gurley, policial aposentado e membro de uma igreja batista no Texas. “Isso é bom, mas há quem discorde, os caras maus. Toda igreja na América precisa de um setor de segurança.”

Ele atua como vigia voluntário em templos desde a década de 1980 e depois virou palestrant­e sobre o assunto.

Gurley não pensa que igrejas sejam alvos preferenci­ais dos atiradores, mas diz que são ambientes mais propícios a incidentes. “Elas têm uma atmosfera acolhedora, sempre de portas abertas.”

Desde o ataque em Sutherland Springs, no Texas, quando 26 fiéis foram mortos por um atirador numa igreja, em novembro, a mensagem de Gurley ganhou força.

“Meu pastor me ligou na manhã seguinte.” Ele organizou um seminário que recomenda a instalação de câmeras, atenção a comportame­ntos incomuns e ao menos um agente armado nas igrejas.

Gurley também já fez uma simulação de tiroteio com a equipe de sua igreja, que recebe 7.000 pessoas por culto. “Queria ter certeza de que todo mundo estava alinhado”, disse. Foi há cinco anos. Desde então, Gurley nunca precisou usar uma arma na igreja. Mas continua alerta.

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Imagens do simulador de treinament­o de ataque a escolas
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Fotos Reprodução
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