Huck, novo FHC e novo tucano
TALVEZ TUDO se acabe na Quartafeira de Cinzas. Luciano Huck prometeu dizer ao povo se fica na Globo ou se sai candidato depois do Carnaval. Pode ser então que FHC pare de cristianizar a candidatura de Geraldo Alckmin.
Seja como for, fica uma questão: qual o sentido dessa tentativa de FHC de dissolver o que resta da política partidária, lançando perfume ácido em seu próprio partido? Não se trata de uma pergunta apenas sobre as profundezas da alma política tardia do ex-presidente.
As respostas são óbvias, mas nem todas desinteressantes. Primeiro, acredita-se que Huck tenha mais chance de vitória. Segundo, FHC e seu círculo da elite econômica mais ilustrada e discreta gostariam mesmo de dissolver a política partidária que está aí.
Não é um elogio da estratégia. É a identificação de um sintoma evidente. Além de candidato a animador de um governo tocado por terceiros, Huck tem rosto e alma desses patrocinadores de novos grupos políticos, esses coletivos de ricos e classe média, por assim dizer, vários deles seus cabos eleitorais.
Multiplicaram-se essas ONGs de formação e patrocínio de quadros políticos novos, extrapartidários, também chamadas sintomaticamente de “start-ups” políticas, com ares despolitizados, mas nesse caso liberais e centro-direitistas. Lançarão dezenas de candidatos ao Congresso.
Os mais notórios e organizados desses grupos têm apoio de empresários e financistas graúdos mais ilustrados. Têm traços do tucanato original, diferente desse que ficou com a carantonha de MDB, do que essa elite tem nojinho (FHC não disse que Huck é a cara do PSDB por acaso).
Não deixam de ser movimentos sociais, nome que sempre foi colado a associações de esquerda e populares, um assunto de interesse de FHC. Não perfazem um partido, sem o que não se vai longe em política. Huck não tem grupo político, sem o que também não se faz um partido. Ainda assim, reconheça-se que há gente, de cima a baixo, procurando enfiar cunhas na política que está aí. Quanto à eficácia ou qualidade da investida, é história para outro dia.
Huck não tem garantia de legenda no DEM, que vai decidir uma candidatura mais tarde, e não se sustenta apenas com o PPS, que lhe escancarou as portas. Mesmo assim, o plano Huck ou outro plano B “novo” da centro-direita solapam Alckmin. Logo de cara, o plano B se torna plano A. Se Huck ou equivalente der chabu, o que sobra?
Alckmin já está em maus lençóis. A direita mais xucra que nele poderia votar adere a Jair Bolsonaro, que ganha outdoors de fazendeiros pelo interior do país e aplausos de colaboracionistas na finança paulista. O inefável senador Álvaro Dias (Podemos) ganha votos no Sul. Rodrigo Maia até pode ser candidato.
A variedade de candidatos à direita come pontos do governador paulista nas pesquisas, o que realimenta a descrença em suas possibilidades, um círculo vicioso. Para piorar, Alckmin começa a dar tiros no pé, se metendo em rolos fora da ordem do dia, como a impopular privatização da Petrobras. Em breve, vai apanhar por causa dos anéis largos e dos trilhos compridos da corrupção paulista.
A eleição e o país prosseguem em desordem.
Parte da elite graúda mais ilustrada quer ganhar a eleição e dissolver a política que está aí
vinicius.torres@grupofolha.com.br