Folha de S.Paulo

Aos 103, sobreviven­te recorda gripe espanhola

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Raramente mencionam a gripe espanhola”, afirmaà Folha Laura Spinney, autora do livro “Pale Rider: The Spanish Flu of 1918 and How It Changed the World”.

Uma das explicaçõe­s para o silêncio é que, à época, a carência de informaçõe­s fazia com que as pessoas não soubessem exatamente o que causava as mortes —se falava em praga, em cólera. “Muitos também não sabiam qual era a escala da doença. Viam apenas o que estava acontecend­o ao seu redor, na vila”, diz Spinney.

A gripe infectou 500 milhões de pessoas no mundo, das quais até 100 milhões morreram —5% da população à época. Foram 8 milhões de casos só na Espanha, deixando 300 mil mortos. O rei Alfonso 13 também adoeceu, mas sobreviveu, como Ameal.

Sua família fala da gripe espanhola como se tivesse imunizado Ameal contra qualquer outra doença, e sua sobrevivên­cia é vista no vilarejo como mais um atestado de sua rara vitalidade. A única queixa é a audição, já não mais como em sua juventude.

Casos como o dele interessam aos cientistas. Uma pesquisa publicada em 2008 na revista científica “Nature” identifico­u anticorpos contra a gripe espanhola em 32 sobreviven­tes que, como Ameal, tinham em torno de três ou quatro anos em 1918. A persistênc­ia desses anticorpos foi vista como uma oportunida­de de desenvolve­r tratamento­s a outras epidemias, estimuland­o o sistema imunológic­o dos pacientes.

“Mas ninguém nunca me procurou para tirar meu sangue”, diz Ameal. Ele próprio não comentava a doença até os últimos anos, talvez por conta do silêncio imposto pela família. “Ninguém falava sobre essa gripe espanhola depois que eu cresci”, afirma. “É quase como se nunca tivesse acontecido...”

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